top of page
Buscar
  • Da redação

Processo por cancelamentos de multas de trânsito em Marília se arrasta no STF. Ex-prefeito Domingos


Domingos Alcalde e João Garcia de Almeida tiveram habeas corpus negado pelo STF


Segue travado no Supremo Tribunal Federal (STF) o processo criminal onde são réus, o ex-prefeito e ex-presidente da Emdurb, Domingos Alcalde e o ex-diretor-adjunto da Autarquia, João Antonio Garcia de Almeida.

Série de recursos (em fase de embargos infringentes) mantém o caso patinando na instância máxima do Judiciário, após passar por outros Tribunais, desde que sentença judicial decretou a prisão dos condenados em regime semiaberto, em março de 2015. Alcalde deve cumprir cinco anos, dois meses e seis dias de reclusão em regime semiaberto e Garcia quatro anos, cinco meses e dez dias de reclusão no mesmo sistema.

O STF negou no ano passado, inclusive, pedidos de habeas corpus. O advogado de defesa Cristiano Mazeto, avocou no pedido desta natureza "o direito fundamental de ser presumido inocente, que não se esvazia progressivamente, à medida em que se sucedem os graus de jurisdição, prevalece até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, como determina a Constituição da República (Art. 5°. LVII)".

Os ministros da Primeira Turma do STF rejeitaram essa tese e entenderam que esta é uma posição minoritária "sobre a qual deve preponderar, na resolução do litígio, o princípio da colegialidade" (prisões a partir da segunda instância) e negaram o Recurso de Agravo.

CANCELAMENTOS DE MULTAS

Alcalde (que foi prefeito de 89 a 92) e João Garcia foram condenados a cumprir pena de reclusão por cancelamentos de cerca de duzentas multas de trânsito. Alcalde deve cumprir cinco anos, dois meses e seis dias de reclusão em regime semiaberto e Garcia quatro anos, cinco meses e dez dias de reclusão no mesmo regime. As fraudes aconteceram, entre os meses de março a dezembro de 2009 (gestão do ex-prefeito Mário Bulgareli).

As ações contra os acusados foram propostas pela Promotoria Criminal e na área cível pelo promotor Oriel da Rocha Queiroz, para ressarcimento aos cofres públicos, cuja execução está em andamento.

A ÍNTEGRA DA DECISÃO

Primeira Turma

Pauta de Julgamentos

Acórdãos

Quinquagésima Quarta Ata de Publicação de Acórdãos, realizada nos termos do art. 95 do RISTF.

AG.REG. NO HABEAS CORPUS 164.794 (789)

ORIGEM : 164794 - SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

PROCED. : SÃO PAULO

RELATOR :MIN. CELSO DE MELLO

AGTE.(S) : DOMINGOS ALCALDE

AGTE.(S) : JOÃO ANTONIO GARCIA DE ALMEIDA

ADV.(A/S) : CRISTIANO DE SOUZA MAZETO (148760/SP)

AGDO.(A/S) : SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Decisão: A Turma, por maioria, negou provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator, vencido o Ministro Ricardo Lewandowski. Segunda Turma, Sessão Virtual de 5.4.2019 a 11.4.2019.

E M E N T A: “HABEAS CORPUS” – PRESUNÇÃO CONSTITUCIONAL DE INOCÊNCIA ( CF , ART. 5º, LVII) – DECISÃO EMANADA DE TRIBUNAL DE SEGUNDO GRAU IMPUGNADA EM SEDE DE RECURSOS EXCEPCIONAIS (REsp e/ou RE) – “EXECUÇÃO PROVISÓRIA” DA CONDENAÇÃO PENAL – POSSIBILIDADE –PRECEDENTES DO STF – COMPREENSÃO DO RELATOR DESTEPROCESSO (MINISTRO CELSO DE MELLO), NO ENTANTO,CONTRÁRIA A ESSA ORIENTAÇÃO, POR SUSTENTAR , EM VOTO VENCIDO, QUE O DIREITO FUNDAMENTAL DE SER PRESUMIDO INOCENTE, QUE NÃO SE ESVAZIA PROGRESSIVAMENTE, À MEDIDA EM QUE SE SUCEDEM OS GRAUS DE JURISDIÇÃO,PREVALECE ATÉ O TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA, COMO DETERMINA A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA (ART. 5º, LVII) – POSIÇÃO MINORITÁRIA , SOBRE A QUAL DEVE PREPONDERAR, NA RESOLUÇÃO DO LITÍGIO, O PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE , RESSALVADO , EXPRESSAMENTE, O ENTENDIMENTO PESSOAL DO RELATOR DESTA CAUSA – PEDIDO DE “HABEAS CORPUS” INDEFERIDO –INTERPOSIÇÃO DE RECURSO DE AGRAVO – PARECER DA PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA PELO NÃO PROVIMENTO DESSA ESPÉCIE RECURSAL – RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO.

O DESPACHO DO MINISTRO CELSO DE MELO (EM MARÇO PASSADO)

"Trata-se de “habeas corpus” impetrado contra decisão emanada do E. Superior Tribunal de Justiça que, apoiando-se em precedentes desta Suprema Corte, entendeu legítima a execução provisória da condenação penal ainda recorrível, desde que proferida ou confirmada por Tribunal de segunda instância.

Busca-se , nesta impetração, preservar o “status libertatis” dos ora pacientes, em ordem a impedir que se instaure, desde logo, a execução antecipada da pena privativa de liberdade...

A decisão do juízo de origem que determinou a execução provisória da pena imposta ao ora agravante não configurou ‘reformatio in pejus’ e nem afrontou a jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal Federal que, no julgamento do HC nº 126.292/SP, Tribunal Pleno, Relator o Ministro Teori Zavascki, entendeu que ‘a execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em julgamento de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência’ (DJe de 17/5/16).

Desse modo, e não obstante a minha pessoal convicção em sentido contrário, devo ajustar o meu entendimento à diretriz jurisprudencial prevalecente nesta Suprema Corte, em respeito e em atenção ao postulado da colegialidade.

Sendo assim , em face do exposto e , sobretudo, em respeito ao princípio da colegialidade, indefiro o pedido de “habeas corpus”, cita o despacho do ministro.

STF NEGOU RECURSO EXTRAORDINÁRIO, EM JANEIRO

Conforme divulgado pelo JP, em janeiro deste ano, o Supremo Tribunal Federal (STF), negou Recurso Extraordinário com Agravo no processo onde o ex-prefeito e ex-diretor da Emdurb, Domingos Alcalde e o ex-diretor-adjunto da autarquia, João Antonio Garcia de Almeida, foram condenados a cumprir pena de reclusão por cancelamentos de cerca de duzentas multas de trânsito. Alcalde deve cumprir cinco anos, dois meses e seis dias de reclusão em regime semiaberto e Garcia quatro anos, cinco meses e dez dias de reclusão no mesmo regime.

Naquela oportunidade, surgiram comentários nos bastidores políticos que os condenados inciariam o cumprimento das penas esta semana. Mas, o advogado deles, Cristiano Mazeto, disse ao JP que ainda caberiam mais dois recursos no próprio STF, sendo um Agravo Interno, um e Embargos de Divergência. "Não há prazos definidos para esses novos tramitação e julgamentos desses novos procedimentos jurídicos", explicou.

A decisão que negou o Recurso Extraordinário no STF foi do relator, ministro Celso de Mello. Alcalde e Garcia ocuparam cargos na Emdurb durante a segunda gestão do ex-prefeito Mário Bulgareli (2008/2012).

Os dois acusados, conforme os autos, "falsamente, declararam a insubsistência de aproximadamente duzentos AITs (Autos de Infração de Trânsito)... os indiciados, agindo em concurso, conluiados e com unidade de propósitos, inseriram, na qualidade de funcionários autorizados, dados falsos no sistema informatizado da Administração Pública, com o fim de obterem vantagem indevida para outrem e para causar dano...De rigor, enfim, a condenação dos acusados pelos delitos que lhes são imputados, cumprindo observar que os elementos de prova coligidos revelaram que os dois agiam mancomunados, conluiados, de forma a favorecer pessoas que mantinham vínculos com eles ou com a Administração Pública municipal", citou a sentença emitida pelo juiz José Augusto Franca Júnior. da 2ª Vara Criminal do Fórum de Marília, em 28 de fevereiro de 2014.

Alcalde e Garcia foram denunciados "por vinte e nove (29) vezes, no artigo 313-A do Código Penal, c.c. o artigo 71, caput e com o artigo 327, § 2º do mesmo Código. "Impondo-lhe a pena privativa de liberdade de quatro (4) anos, cinco (5) meses e dez (10) dias de reclusão, a ser iniciada no regime semiaberto, assim como a pena de vinte e um (21) dias-multa, à razão do valor mínimo unitário, corrigido na forma da lei", decidiu o juiz.

DECISÃO QUE NEGOU RECURSO NO STF

"Verifico que o presente recurso de agravo não impugna todos os fundamentos em que se apoia o ato decisório ora questionado. É que a parte agravante, ao insurgir-se contra a decisão que não admitiu o apelo extremo por ela interposto, deixou de ilidir todos os fundamentos jurídicos em que se assentou o ato decisório proferido pelo Tribunal “a quo”, abstendo-se de impugnar a incidência do óbice previsto na Súmula 279/STF.

A ausência de impugnação abrangente de todos os fundamentos nos quais se assenta a decisão recorrida significa que a parte agravante, o assim proceder, descumpriu típica obrigação processual que lhe incumbia atender, pois , como se sabe, impõe-se ao recorrente afastar , pontualmente, cada uma das razões invocadas como suporte do ato decisório recorrido...

Não se desconhece que o ordenamento normativo, informado pela teoria geral dos recursos, erige à condição de pressuposto essencial ( e , portanto, indispensável) inerente às modalidades recursais a obrigação, que é indeclinável, da parte recorrente de expor as razões de fato (quando cabíveis) e de direito viabilizadoras da reforma ou da invalidação da decisão recorrida.

É tão significativo esse específico pressuposto recursal de índole objetiva que, desatendido pela parte recorrente, produz , como inevitável efeito consequencial, a própria incognoscibilidade do meio recursal utilizado.

Cabe insistir , pois, que se impõe a quem recorre, como indeclinável dever processual, o ônus da impugnação especificada, sem o que se tornará inviável o conhecimento do recurso interposto, valendo referir , ainda, que não basta que a parte agravante restrinja-lhe o conteúdo, limitando-o a alegações extremamente vagas, sem desenvolver, de modo consistente , as razões que apenas genericamente enunciou.

Nesse contexto , torna-se insuficiente a mera renovação, em sede de agravo , das razões invocadas como fundamento do recurso extraordinário, que, deduzido pela parte agravante, veio a sofrer juízo negativo de admissibilidade na instância “a quo”. Inadmitido o apelo extremo, incumbe , o recorrente, questionar todos os motivos que conduziram o Tribunal de jurisdição inferior a negar processamento ao recurso extraordinário.

Sendo assim , e em face das razões expostas, não conheço do presente agravo, por não impugnados , especificadamente, todos os fundamentos da decisão agravada", despachou o

ministro Celso de Mello.

A CONDENAÇÃO EM MARÍLIA

"Condenação à Pena Privativa de Liberdade e Multa SEM Decretação da Prisão - Sentença Completa DOMINGOS ALCALDE, brasileiro, natural de Marília - SP, nascido em 23/08/1936, filho de Thomaz Alcalde e de Antônia Fernandes, portador do RG nº 2007498 e JOÃO ANTÔNIO GARCIA DE ALMEIDA, brasileiro, natural de Pederneiras - SP, nascido em 25/03/1946, filho de Nestor Garcia de Almeida e de Eliza Maria de Almeida, portador do RG nº 3428229, foram denunciados pelo Ministério Público como incursos, por vinte e nove vezes, no artigo 313-A c/c o artigo 71, do Código Penal, isto porque, segundo a denúncia entre os meses de março a dezembro de 2009, de forma continuada, nas dependências da Empresa de Desenvolvimento Urbano e Habitacional da Marília (Emdurb), os indiciados, agindo em concurso, conluiados e com unidade de propósitos, inseriram, na qualidade de funcionários autorizados, dados falsos no sistema informatizado da Administração Pública, com o fim de obterem vantagem indevida para outrem e para causar dano.

Conforme apurado, Domingos e João exerciam as funções de Diretor Presidente e Diretor Adjunto da Emdurb. Por isso, os denunciados tinham a atribuição de analisar a regularidade dos autos de infração de trânsito (AIT) lavrados pelos agentes municipais. Dessa forma, os denunciados, falsamente, declararam a insubsistência de aproximadamente duzentos AITs. Para tanto, os denunciados utilizaram-se de vários argumentos falsos. É certo ainda que vários outros AITs, nas mesmas condições dos cancelados, foram considerados regulares pelos denunciados. Isso confirma que tinham conhecimento de que os argumentos aduzidos não acarretavam a insubsistência dos AITs. Dentre as pessoas beneficiadas pela inserção desses dados falsos no sistema informatizado possuem ligação pessoal ou profissional com os denunciados, com a própria Emdurb ou com a Administração Pública Municipal. Recebida a denúncia (fl. 1807), os acusados foram citados (fl. 1820v, 1845v) e apresentaram resposta à acusação (fl. 1824/1838, 1848/1855). Sobreveio audiência, na qual foram inquiridas as testemunhas de acusação (fl. 1925/1933) e as testemunhas comuns (fl. 1934/1937). Por fim, os réus foram interrogados (fl. 1972). Nos memoriais, o Dr. Promotor de Justiça requereu a condenação dos acusados (fl. 1975/1988), ao passo que a Defesa dos acusados postulou a absolvição, alegando não constituir o fato infração penal, sobretudo por serem legítimas as anulações das infrações (fl. 2001/2009). Após a apresentação de alegações finais por parte da Defesa, sobreveio ofício da Justiça Federal, solicitando cópia das mídias pertinentes. Outrossim, foi convertido o julgamento em diligência para que o cartório providenciasse certidão de antecedentes do réu Domingos (fl. 2029-9º volume). Anexaram-se aos autos os documentos de fl. 2037/2081, após o quê o Ministério Público complementou suas alegações finais, reiterando pedido de condenação dos réus (fl. 2085-10º volume), ao passo que a Defesa, fazendo o mesmo em relação às suas alegações, postulou, ainda, a degravação de todo o material obtido através das escutas telefônicas (fl. 2088/2089-10º volume). É o relatório. DECIDO. Não é difícil constatar que os acusados Domingos e João Antônio, o primeiro na função de Diretor Presidente e o segundo na de Diretor Adjunto da empresa pública municipal EMDURB, praticaram ações que, além de haverem dispensado vários proprietários de veículos do pagamento de multas por infrações de trânsito e das penalidades administrativas pertinentes, ainda causaram prejuízo aos cofres da instituição, fazendo com que esta deixasse de arrecadar valores relacionados com autos de infração regularmente constituídos. Por meio de "declarações de insubsistência", que ambos emitiram e assinaram (a autenticidade delas nunca foi contestada), vários Autos de Infração de Trânsito (AITs) foram cancelados, produzindo tais consequências. Essas "declarações", consoante ficou apurado, estavam assentadas sobre argumentos inconsistentes. Ora reportavam-se a registros que não eram de inserção obrigatória nos Autos de Infração, ora à inexistência de registros que, em verdade, deles constavam. Exemplos dessa anomalia são encontrados nas declarações de fls. 28/29, 38, 53, 57 e 59, assinadas por João Antonio, Diretor Adjunto, e nas de fl. 79, 113, 115, 117 e 119, assinadas por Domingos Alcalde, Diretor Presidente da EMDURB. Por meio delas os denunciados afirmaram a insubsistência dos Autos de Infração de Trânsito sob o argumento de que eles não traziam inscritos os Códigos de Licenciamentos dos Veículos, Códigos estes que a Portaria 59/2007 do DENATRAN (fl. 663/668), invocada nas próprias declarações, não eram de inserção obrigatória, como deixou claro em Juízo o Delegado de Polícia André Luiz Nemer Rapado no depoimento de fl. 1929/1930-9º volume destes autos. O laudo de fls. 691/705, tendo por objeto os AITs anexados aos autos e as declarações de insubsistência emitidas pelos denunciados, traz conclusão no seguinte sentido: ...a enorme maioria dos autos de infrações cujos registros foram declarados insubsistentes encontram-se regularmente preenchidos. As informações neles existentes não nos permite reconhecer-lhes a inconsistência. Não é verdadeira a assertiva existente nas Declarações de Insubsistência que antecedem os autos de infrações cancelados -, que "a Portaria DENATRAN n. 59/2007 determina que os campos do Auto de Infração devam estar integralmente preenchidos" (sic), já que existem campos de preenchimento facultativo. No mesmo sentido veio o laudo de fl. 922/1181, que teve por objeto os registros do Banco de Dados da EMDURB e que confirmou a inserção das insubsistências em frente às inscrições dos ATIs. Infere-se da prova, outrossim, que várias das insubsistências declaradas visavam a favorecer pessoas que, ou possuíam ligação pessoal ou profissional com os denunciados, ou com a própria EMDURB, ou, então, com a Administração Pública Municipal. Vejam-se, a propósito, os documentos constantes de fls. 28/31, 37/38 e 49, 61/63, 161 e 162, 219 e 220, 271 e 272, 413 e 414. A testemunha Marcos Gagliato informou em Juízo que trabalhou na EMDURB entre abril de 2001 e dezembro de 2009. E disse ter ouvido comentários de terceiros de que multas aplicadas estavam sendo "quebradas" pelos Diretores da empresa, Domingos Alcalde e João Antonio (fl. 1925/1926-9º volume). Sonia Maria Garcia Santana Fanti declarou que vendeu um veículo Fiesta para a pessoa de Lourival Simões. Lourival, segundo ela, não transferiu o veículo para seu nome, fato que lhe trouxe muitos aborrecimentos, já que as multas aplicadas por infrações praticadas por Lourival acabaram cobradas da sua pessoa. Informou que dialogou por telefone com Lourival e este se comprometeu a resolver a questão das multas, ignorando ela as circunstâncias em que tal solução foi alcançada (fl. 1927/1928). A resposta a esta questão foi dada pelos investigadores de Polícia Gilberto Silvino e Clebert Eimori Kato. Eles relataram em Juízo que na época realizavam interceptação telefônica autorizada para apurar eventual ligação de Lourival Simões com o comércio ilícito de entorpecentes. No curso dessa interceptação foi captado diálogo em que Sonia questionava Lourival das multas que estavam sendo reiteradamente registradas em nome dela (ex-proprietária do veículo Fiest vendido para ele). Nesse diálogo, Lourival observa que ela poderia manter-se despreocupada porque ele já estava conversando com uma tal "Creuza" (ou com o Prefeito) para "quebrar" essas multas (fl. 1931/1932 e 1933-9º volume). Esse diálogo está transcrito às fls. 1313 do 6º volume destes autos. Interrogados a respeito, João Antonio e Domingos negaram envolvimento no esquema de cancelamento dos AITs. Disseram em Juízo que o exame desses Autos era realizado por funcionários da EMDURB, especialmente os que ocupavam cargos no setor de processamento de dados. Afirmaram que as declarações de insubsistências chegavam às suas mãos já prontas e que as assinavam crendo na exatidão dos pareceres do setor (fl. 1968/1969 e 1970/1971-9º volume). Já as testemunhas Vicente Pinto Roim Neto e Eduardo Alecio Cassoni, ocupantes de cargos dentro da EMDURB, disseram que, embora os registros de insubsistência dos AITs fossem mesmo lançados pelo setor de Processamento de Dados da empresa, tal operação só ocorria mediante prévia emissão de declarações assinadas pelos denunciados (fl. 1934/1935 e 1936/1937-9º volume). Não há dúvida, portanto, que Domingos e João Antonio faltaram com a verdade. Conquanto o disposto no inciso I do parágrafo único do artigo 281 do Código de Trânsito lhes permitisse decidir da subsistência ou da insubsistência dos AITs., a opção pela segunda alternativa exigia embasamento fático-jurídico. Sua admissão estava condicionada ao reconhecimento da inconsistência dos Autos ou da existência de irregularidades no preenchimento deles.

De acordo com a doutrina do Desembargador ARNALDO RIZZARDO, a declaração de insubsistência só é possível quando ocorre "a falta de elementos de identificação do veículo, de tipicidade, de provas claras, ou o auto apresenta irregularidades e vícios tais a ponto de impedir o reconhecimento do tipo de infração caracterizada". Nas hipóteses mencionadas nestes autos, ficou claro que os argumentos e as normas invocadas pelos denunciados não respaldavam a opção que adotaram. Jamais poderiam servir de fundamentação às declarações de insubsistência. E não se venha argumentar que as decisões foram tomadas por algum equívoco de interpretação. Várias daquelas a que se reporta a denúncia foram adotadas com o manifesto propósito de favorecer pessoas que, como anotou o Dr. Promotor de Justiça na denúncia, possuíam, na época, ligação pessoal ou profissional com os denunciados, ou com a própria EMDURB, ou, então, com a Administração Pública Municipal. O que se constata, na espécie, é que a expedição das declarações de insubsistência não visava a nenhum outro fim senão conferir certa aparência de legalidade à manobra dolosa posta em execução, manobra esta que os acusados dirigiam conscientemente e que alcançava sua consumação com a inserção de dados falsos no sistema da empresa pública municipal.

Bem por isso é que Gláucia Elaine Baio Guijo, que na época era funcionária integrante do quadro de pessoal do EMDURB, foi seriamente repreendida por Domingos Alcalde. Ele acreditava ter sido ela quem entregara à Polícia, durante busca procedida na sede da empresa, os documentos que comprovavam as irregularidades. Lembrou o Dr. Promotor de Justiça o registro constante da notitia criminis que deu ensejo à instauração do inquérito, de acordo com o qual tais documentos eram mantidos em armário trancado a chave e de modo a impedir que terceiras pessoas lhes tivessem acesso (fl. 5). Não socorre os denunciados o argumento de que a inserção dos dados no sistema foi obra de funcionários do CPD. Desde que era deles (acusados) o poder de direção das atividades da empresa e de decisão sobre a sorte dos AITS., é de se acreditar que tal inserção não teria acontecido se não a houvessem determinado. Não há na prova indício algum de que os servidores subordinados a eles tenham realizado as operações por iniciativa própria. Objetou a Defesa no sentido de que haveria necessidade de se proceder à transcrição do material coligido por meio das interceptações telefônicas. A objeção, no entanto, não procede. Em primeiro lugar, porque a lei especial não impõe a providência. Em segundo, porque a prova deixou claro que os diálogos aqui tomados como relevantes para julgamento da imputação foram todos obtidos de forma ocasional, posto que a interceptação então promovida visava à apuração de fatos criminosos de natureza diversa e que envolviam outra pessoa. Quanto ao argumento que a medida permitiria exame da legalidade da interceptação, tenho que lhe fala consistência, visto que os documentos de fl. 903/904 evidenciam que tanto a interceptação quanto o aproveitamento dela para estes autos deram-se com autorização do Juiz da Terceira Vara Criminal desta comarca. De rigor, enfim, a condenação dos acusados pelos delitos que lhes são imputados, cumprindo observar que os elementos de prova coligidos revelaram que os dois agiam mancomunados, conluiados, de forma a favorecer pessoas que mantinham vínculos com eles ou com a Administração Pública municipal. No tocante às penas, bem lembrou o Dr. Promotor de Justiça que as ações criminosas visavam a produzir efeitos não apenas na órbita fiscal, com o cancelamento das multas, como também, e principalmente, no âmbito administrativo, livrando pessoas que praticaram infrações de trânsito da punição prevista na legislação pertinente. Expressiva a reprovabilidade social das ações ilícitas reconhecidas. Domingos Alcalde já sofreu condenação no passado, como informam os documentos constantes de fl. 2037/2081-9º volume. De forma que, atento a este fator e às demais circunstâncias elencadas no artigo 59 do Código Penal, estabeleço a base de suas penas, para cada um dos crimes, em dois (2) anos e quatro (4) meses de reclusão e onze (11) dias-multa. João Antonio não possui antecedentes criminais e não vejo nenhuma circunstância judicial que possa ser invocada contra ele. Por tal motivo, a base de suas penas, para cada qual dos delitos, é fixada em dois (2) anos de reclusão e dez (10) dias-multa. Não existem circunstâncias atenuantes ou agravantes aplicáveis ao caso. Não obstante, como os acusados ocupavam cargos em comissão e função de direção da empresa pública municipal, incide a causa de aumento de pena prevista no artigo 327, § 2º do Código Penal (terça parte), razão pela qual as sanções de Domingos são elevadas para três (3) anos, um (1) mês e dez (10) dias de reclusão e catorze (14) dias-multa, enquanto as de João Antônio são elevadas para dois (2) anos e oito (8) meses de reclusão e treze (13) dias-multa. A prova demonstrou que eles executaram no mínimo vinte e nove vezes a ação descrita no mesmo tipo penal, sendo possível dizer que elas aconteceram nas mesmas condições de tempo, modo e lugar. De acordo com o artigo 71 do Código Penal, há que se reconhecer na hipótese a existência da continuidade delitiva, à vista do que tomo as sanções definidas para um dos delitos e faço incidir sobre elas o aumento de dois terços (2/3), aqui levando em consideração o número de infrações admitidas. Com isso, as penas de Domingos são aumentadas para cinco (5) anos, dois (2) meses e seis (6) dias de reclusão e vinte e três (23) dias-multa; as de João Antônio são elevadas para quatro (4) anos, cinco (5) meses e dez (10) dias de reclusão e vinte e um (21) dias-multa. De se observar que a aplicação da regra da continuidade delitiva só vem beneficiar os denunciados. Do contrário, aplicada que fosse a regra do concurso material de infrações (Código Penal, artigo 69) e as penas dos vinte e nove delitos teriam de ser somadas. A possibilidade de reconhecimento de um único delito (sem a continuidade) está afastada, posto que os documentos constantes deste caderno evidenciaram que os acusados repetiram a mesma ação criminosa por diversas vezes, executando, em cada um delas, um delito autônomo. A primariedade dos denunciados autoriza a fixação do regime semiaberto para início da censura carcerária (Código Penal, artigo 33, § 2º, alínea "b"). Em razão do montante dessa pena (superior a quatro anos), não é possível a substituição dela por sanções restritivas de direito para nenhum dos denunciados. Todavia, como ambos permaneceram em liberdade no curso do processo e como não vejo razão nenhuma para ordenar o encarceramento cautelar deles (as hipóteses do artigo 312 do Código de Processo Penal não estão caracterizadas), permito que recorram soltos da condenação.

DIANTE DO EXPOSTO, julgo procedente a denúncia que deu início a esta ação penal, fazendo-o para: a-) condenar DOMINGOS ALCALDE como incurso, por vinte e nove (29) vezes, no artigo 313-A do Código Penal, c.c. o artigo 71, caput e com o artigo 327, § 2º do mesmo Código, impondo-lhe a pena privativa de liberdade de cinco (5) anos, dois (2) meses e seis (6) dias de reclusão, que ele haverá de iniciar no regime semiaberto, assim como a pena de vinte e três (23) dias-multa, à razão do valor mínimo unitário, corrigido na forma da lei; b-) condenar JOÃO ANTÔNIO GARCIA DE ALMEIDA como incurso, por vinte e nove (29) vezes, no artigo 313-A do Código Penal, c.c. o artigo 71, caput e com o artigo 327, § 2º do mesmo Código, impondo-lhe a pena privativa de liberdade de quatro (4) anos, cinco (5) meses e dez (10) dias de reclusão, a ser iniciada no regime semiaberto, assim como a pena de vinte e um (21) dias-multa, à razão do valor mínimo unitário, corrigido na forma da lei. Eles terão os nomes registrados no rol dos culpados após o trânsito em julgado da decisão. Pagarão ao Estado a taxa judiciária de cem (100) Ufesp's. Poderão recorrer em liberdade desta sentença. P. R. I. C. 28/02/2014"












311 visualizações0 comentário
bottom of page