Um cliente do Supermercado Confiança em Marília foi condenado a pagar R$ 5 mil em indenização por danos morais a um fiscal do estabelecimento. A decisão é do juiz Luís César Bertoncini, da 3ª Vara Cível do Fórum de Marília e cabe recurso.
Conforme os autos, o fiscal ajuizou ação alegando, em síntese, que foi funcionário do Supermercado Confiança exercendo a função de fiscal entre dezembro de 2021 e janeiro de 2022.
Relatou que no dia 4 de janeiro de 2022, no exercício de suas funções, orientou o cliente a guardar sua bolsa de entrega no guarda-volumes antes de adentrar o estabelecimento, conforme procedimento padrão de segurança.
Disse que o réu reagiu de forma agressiva, proferindo ofensas verbais de baixo calão e fazendo ameaças de morte. Relatou ainda que quatro dias depois o réu retornou ao supermercado e, aproveitando-se de um momento de descuido, desferiu-lhe um soco no lado esquerdo do rosto, causando escoriações e vermelhidão, fato captado pelas câmeras de segurança do supermercado e presenciado por testemunhas.
Alegou que tal fato lhe causou danos morais, motivo pelo qual pleiteou a condenação do cliente ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 30.000,00.
DEFESA
O réu apresentou contestação, alegando que trabalha como entregador de lanches e açaí, frequentando diariamente o Supermercado Confiança para buscar pães, sempre portando sua bolsa de entrega para acomodar os produtos. Sustentou que nunca foi impedido de entrar com a mochila e que outros funcionários jamais o impediram, sendo informado de que não havia qualquer proibição quanto à entrada de clientes com bolsas.
Afirmou que no dia dos fatos, o fiscal o abordou de forma grosseira, afirmando que ele não poderia entrar com a "bag", proferindo as frases "eu quem mando aqui" e "eu estou te parando agora", o que teria gerado discussão entre eles.
Alegou que no dia 8 de janeiro, ao retornar ao estabelecimento sem a bolsa, foi agredido verbalmente pelo autor que teria dito "se quiser resolver lá fora no estacionamento" e "porque eu sei lutar", momento em que, sentindo-se ameaçado e temendo por sua integridade física, desferiu um soco no autor em legítima defesa.
O JUIZ DECIDIU
"Trata-se de ação indenizatória que merece ser julgada procedente. De acordo com a inicial, o autor, fiscal de supermercado, foi agredido pelo réu verbal e fisicamente em seu ambiente de trabalho após pedir-lhe para guardar sua bolsa no guarda-volumes. O réu, ao seu turno, afirma que o autor o ameaçou e que a agressão se deu em legítima defesa.
Pois bem! O imbróglio envolvendo as partes se desenrolou em duas oportunidades. Uma no dia 04/01/2022, em que o réu, ao tentar entrar no supermercado em que o autor trabalhava como fiscal, foi por ele impedido porque carregava consigo uma bolsa. Outra em 08/01/2022, quando o réu desferiu um soco no rosto do autor.
Em 04/01/2022, tanto autor, quanto réu, alegam que sofreram ofensas verbais. Porém, não há qualquer prova nos autos que corrobore a versão de quaisquer das partes sobre como se deram os fatos neste dia. O conjunto probatório produzido pelas partes não foi capaz de esclarecer se o autor colocou a mão no peito do réu, se o ameaçou; ou se o réu ameaçou o autor. O que se tem de incontroverso, quanto ao dia 04/01/2022, é que o réu tentou entrar no supermercado onde trabalhava o autor com uma bolsa de entrega e que foi interceptado por ele (autor), sendo orientado a deixar a bolsa no guarda volumes.
Também é incontroverso que o réu não gostou da interpelação e que questionou a ordem, pois entrava diariamente no estabelecimento com sua "bag". Porém, não há prova do que foi dito pelas partes e de como a abordagem do autor se deu.
Entretanto, quanto ao dia 08/01/2022, a prova dos autos é robusta e não deixa margem para dúvidas de que o réu agrediu o autor sem justificativa. As imagens das câmeras de segurança do estabelecimento em que se deram os fatos demonstram de forma cristalina que no dia 08 de janeiro de 2022 o réu adentrou o supermercado e, sem qualquer provocação, quando o autor passou do seu lado, desferiu-lhe um soco no rosto. Não houve provocação do autor.
Ao contrário, ele seguia na parte externa do supermercado e o réu, próximo da porta de entrada, ao avistar o autor, desvia seu curso, disfarça, aguarda a aproximação do autor e de inopino lhe desfere um soco violento no rosto. O autor não teve qualquer reação violenta. Apenas entrou no estabelecimento. Na sequência, o réu também entrou e se aproximou do autor, que continuou sem apresentar qualquer reação violenta. Depois o réu se afasta, não havendo mais imagens suas.
O próprio réu, em audiência, confessou a agressão, embora tenha tentado justificá-la com uma suposta "discussão acalorada" ocorrida dias antes. A versão defensiva não encontra respaldo no conjunto probatório. As imagens mostram que o autor estava exercendo normalmente suas funções quando foi surpreendido pela agressão. Não há nos vídeos qualquer indicação de provocação ou ameaça por parte do autor que pudesse justificar a reação violenta do réu. A prova produzida pelo réu não foi capaz de infirmar a que produziu o autor.
As testemunhas arroladas pelo réu ouvidas em audiência não estavam presentes nos dias dos fatos e nada souberam responder sobre as agressões relatadas na inicial, tampouco se houve provocação ou ameaça do autor para com o réu. A alegação de legítima defesa suscitada pelo réu não merece acolhimento.
Para a configuração dessa excludente de ilicitude, exige-se a presença cumulativa de agressão injusta, atual ou iminente, e o uso moderado dos meios necessários para repeli-la.
No caso em análise, não houve qualquer agressão ou ameaça por parte do autor no dia 08/01/2022. Quanto ao dia 04/01/2022, a mera orientação para cumprimento das normas de segurança do estabelecimento, ainda que feita de forma enérgica, não configura agressão injusta apta a autorizar reação violenta. O dano moral sofrido pelo autor é evidente na hipótese.
A agressão física injustificada, perpetrada em local público e no ambiente de trabalho da vítima, na presença de colegas e clientes, ultrapassa os limites do mero dissabor e configura efetiva lesão aos direitos da personalidade. O autor foi submetido a constrangimento, humilhação e violência física que certamente abalaram sua honra, dignidade e integridade psicológica...
Ante o exposto, julgo procedente a pretensão autoral... e o faço para condenar o réu ao pagamento, em favor do autor, de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00, corrigido monetariamente pela tabela prática do TJSP a partir da data desta sentença e acrescido de juros de mora a partir da citação de acordo com a taxa legal divulgada pelo Banco Central do Brasil... Em razão da sucumbência, condeno o réu ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em R$ 2.500,00, nos termos do artigo 85, § 8º, do Código de Processo Civil".
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