J. POVO- MARÍLIA
Criança devolve à avó o celular furtado pela mãe, que acabou condenada pela Justiça Criminal

Uma mulher foi com a mãe dela e um filho de três anos na casa da ex-sogra, onde sua filha de nove anos passa as noites. Na visita, furtou um celular da idosa. Passados alguns dias, a menina disse à avó que o celular que ela estava procurando estava na casa da mãe dela e levou o aparelho de volta. “Vó, o celular que você está procurando está na casa da minha mãe, quando ela for ao banheiro, eu vou pegá-lo e trazê-lo de volta", afirmou a menina, conforme os autos do processo.
Houve registro de Boletim de Ocorrência e a autora do furto acabou condenada a 1 ano 6 meses e 20 dias de reclusão em regime fechado, com a pena revertida em prestação de serviços à comunidade, além de outras sanções.
O caso tramitou pela 3ª Vara Criminal do Fórum de Marília e a sentença, que cabe recurso, foi do juiz José Augusto de Franca Júnior.
O CASO
Consta nos autos que a acusada, foi incursa no art. 155, caput, do Código Penal porque, segundo consta na denúncia, no dia 24 de janeiro de 2019, por volta das 19h, na Vila Real, Zona Sul de Marília, a acusada subtraiu, para si, coisa alheia móvel consistente em um aparelho celular antigo, da marca Alcatel, de modelo desconhecido, com teclado, câmera fotográfica e sem internet, avaliado em R$ 300,00, pertencente à sua ex-sogra.
Houve Inquérito policial e recebimento da denúncia. Realizada nova audiência de instrução ,com colheita de provas orais. O MP, em seus memoriais, reiterou o pleito de condenação. A Defensoria Pública, por seu turno, arguiu que o acervo probatório se mostrou frágil. Em caso de condenação, protestou por penas mínimas, incidindo o art. 387, §2º, do Código de Processo Penal, a fim de ser fixado regime inicial menos gravoso (aberto).
O JUIZ DECIDIU
"Em que pese a combatividade da Defensoria Pública em seus memoriais finais, cumpre destacar que o integral acolhimento da pretensão punitiva desvela-se insofismável, porquanto estão provadas, à saciedade, a autoria e a materialidade delitivas, nos termos doravante esposados.
Colige-se dos autos que o Ministério Público obtempera que a acusada foi até a residência da vítima e, aproveitando-se de um momento de distração dela, subtraiu o referido aparelho celular.
A ré foi casada com o filho da vítima e estão separados há sete anos, tendo uma filha em comum, de nove anos de idade, que dorme na casa da avó todas as noites. Sendo assim, na data dos fatos, a acusada entrou na casa da vítima, pediu água e ficou conversando com a ela.
Em dado momento, pediu para ir ao banheiro e, posteriormente, foi embora. Na manhã seguinte, a vítima sentiu a falta de seu aparelho celular que havia deixado em cima do sofá. Dois dias após o ocorrido, a neta da ofendida falou “vó, o celular que você está procurando está na casa da minha mãe, quando ela for ao banheiro, eu vou pegá-lo e trazê-lo de volta”. No dia seguinte, a menina levou o referido aparelho celular.
Destarte, encerrada a instrução probatória, cumpre destacar que a autoria e a materialidade delitivas restaram sobejamente demonstradas nos autos, de acordo com a portaria do inquérito policial, boletim de ocorrência, auto de avaliação indireta (fls. 06), relatório final do Douto Delegado de Polícia (fls. 33), bem como pelas provas orais produzidas em solo policial e ratificadas em audiência, sob o crivo da ampla defesa e do contraditório:
A vítima A, ouvida na fase inquisitiva, declarou ipsis litteris o seguinte: Com relação aos fatos que estão sendo apurados no BO. 1372/2019 , informo que a acusada foi amasiada com meu filho e os dois estão separados há sete anos; Que o casal tem uma filha de nove anos que mora comigo e dorme com a gente todas as noites; No inicio deste ano, minha ex-nora entrou em casa, pediu água e nós duas ficamos conversando um pouco e em dado momento ela pediu para ir ao banheiro e depois foi embora; Na manhã seguinte senti a falta do meu aparelho celular que eu havia deixado em cima do sofá;
Após dois dias , minha neta falou: “vó o celular que você está procurando está na casa da minha mãe, quando ela for ao banheiro, eu vou pegá-lo e trazê-lo de volta"; No dia seguinte, me trouxe o aparelho celular; Após eu estar com o celular nas mãos, certo dia, quando minha ex-nora passou lá para buscar a menina eu perguntei como ela tinha tido coragem de furtar o meu celular e ela negou, mesmo eu falando que minha neta o trouxe de volta falando que o encontrou na casa dela; Após este episodio não deixei mais a ex-nora entrar em casa.
A acusada disse que agiu sem pensar, pois estava passando dificuldades. A testemunha, ex-marido da acusada, ouvido na fase inquisitiva, declarou ipsis litteris o seguinte: Com relação aos fatos que estão sendo apurados no BO.1372/2019 , informo que sou separado e nós temos uma filha em comum de nove anos de idade, a qual pousa comigo todos os dias e durante o dia após sair da escola passa o dia na casa da mãe; No final de janeiro do corrente ano a ex-mulher, o filho dela de 3 anos de idade e a mãe dela, foram em casa e ficaram conversando com a minha mãe ; No dia seguinte fui trabalhar e quando retornava do serviço, vi minha ex-mulher andando na rua com mais algumas pessoas e quando ela me viu, a mesma ficou assustada, deu as costas para mim e vi ela guardando algo na cintura; Quando cheguei em casa, através de minha mãe, fiquei sabendo que alguém na noite anterior havia furtado o celular dela e eu lembrei que as únicas pessoas diferentes que foram em casa foram minha ex-mulher e a mãe dela e lembrei também que ela escondeu algo na cintura quando eu a via na rua;
Fui até a casa de minha ex-mulher e perguntei se ela por engano ou se o menino por brincadeira havia pego o celular da minha mãe e ela negou; Após uns três dias, minha filha demonstrou medo para voltar para a casa da mãe, e eu disse: “mas você precisar ir pois tenho que trabalhar “ e ela falou: “ é que o celular da avó estava com minha mãe, e hoje enquanto ela tomava banho, eu peguei o celular e o trouxe, e tenho medo que ela me bata".
Peguei o aparelho celular e o devolvi para minha mãe; Tentei conversar amigavelmente com a ex-mulher, mas toda vez que tocava no assunto do celular ela mudava o rumo da conversa e no fim negou de forma veemente que havia furtado o celular da minha mãe; A menina continua indo na casa da mãe e não sofreu represálias por ter devolvido o aparelho celular para nós"...
A acusada, ouvida em Juízo relatou que na época dos fatos foi a residência da vítima, permanecido no local. Ao sair, percebeu que o aparelho celular estaria com o seu filho. Informou que permaneceu com o aparelho por aproximadamente 5 dias, consumindo os créditos. Esclareceu que o aparelho foi devolvido por sua filha, sem a sua autorização.
Portanto, tal versão encontra amparo nos demais substratos de prova, tais como a versão da vítima e auto de avaliação indireta. Há, portanto, nos autos a comprovação concreta do animus de assenhoreamento por parte da ré, sendo típico o fato típico ora imputado. Registre-se ainda que os substratos probatórios colhidos na fase policial, quando referendados judicialmente, podem servir de base a édito condenatório, conforme resta pacificado na Suprema Corte... Reitere-se que “é pacífica a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de que 'os elementos do inquérito podem influir na formação do livre convencimento do juiz para a decisão da causa quando complementam outros indícios e provas que passam pelo crivo do contraditório em juízo' (...). Dessa feita, os depoimentos prestados por réus e testemunhas na fase policial, na parte em que harmônicos com a prova documental e com a prova oral colhida em juízo, podem servir para a formação do convencimento judicial quanto à responsabilidade penal do agente” - AP 618/RJ Rel. Min. Dias Toffoli".
Ademais, a vítima confirmou os fatos imputados pelo Ministério Público quando ouvida na Delegacia...Assim, plenamente convicto pela condenação da ré, por infração ao art. 155, caput, do Código Penal, passo à DOSIMETRIA DA PENA...
Ante todo o exposto na fundamentação e o que mais consta dos autos, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva deduzida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, e o faço para CONDENAR a acusada como incursa no art. 155, caput, do Código Penal, ao cumprimento de pena privativa de liberdade correspondente a 01 (um) ano, 06 (seis) meses e 20 (vinte) dias de RECLUSÃO, em regime inicial FECHADO, bem como ao pagamento de 14 (catorze) dias-multa, no parâmetro mínimo legal. Submeto a acusada ao cumprimento de PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS A COMUNIDADE e LIMITAÇÃO DE FINAIS DE SEMANA, nos moldes a serem estabelecidos pelo douto juízo da execução criminal. CONCEDO-LHE o direito de recorrer da presente decisão em liberdade".

