A empresa de ônibus Guerino Seiscento foi condenada a pagar R$ 10 mil em indenização por danos morais à uma passageira que entrou em ônibus errado e foi parar em outra cidade, após parada em lanchonete em posto de combustíveis à beira da estrada, no Estado do Paraná. A decisão é do juiz Luís César Bertoncini, da 3ª Vara Cível do Fórum de Marília e cabe recurso.
O CASO
A passageira Edna Moreira Soares ajuizou a ação alegando, em síntese, que recebeu de sua chefe, uma passagem adquirida junto à empresa passagens para o dia 23 de março de 2025, às 21:45 horas, com partida de Castro/PR e destino final Marília.
Afirmou que "ao realizarem uma parada no restaurante Ipirangão, entre as cidades de Castro/PR e Piraí do Sul/PR, desembarcou para utilizar o banheiro e comprar alimento. Ao retornar ao local de embarque do ônibus, descobriu que o mesmo havia partido antes do esperado e sem qualquer aviso. Embarcou no único ônibus disponível no local e desceu na cidade de Piraí do Sul/PR, sem qualquer assistência da empresa e aguardou a abertura do guichê da mesma até as 8:00 horas da manhã do dia seguinte".
Acrescentou que ao conseguir contatar funcionários no guichê, foi orientada que deveria voltar a Castro/PR para solucionar o ocorrido e voltar a Marília. Ao chegar novamente em Castro/PR, conseguiu passagem para o destino final somente às 21:45 horas do dia 24 de março e previsão de chegada em Marília às 3:30 horas do dia 25.
Além disso, sua bagagem ficou extraviada por aproximadamente 10 dias. Solicitou a devolução da bagagem à empresa, entretanto, a mesma consignou a entrega a assinatura de termo de quitação indenização de danos morais e materiais, sendo-lhes devolvida somente no dia 1° de abril de 2025, por intermediação de seu advogado.
Relatou que a situação vivenciada a colocou em situações degradantes e desumanas, causando danos morais, eis que extrapolou o mero dissabor.
Pediu indenização por danos morais no valor não inferior a R$ 20.000,00.
DEFESA
A empresa apresentou contestação e alegou culpa exclusiva da passageira, que teria entrado em outro ônibus no posto de parada por erro próprio.
Alegou que o motorista realizou os procedimentos de conferência dos passageiros e aguardou o tempo regulamentar na parada.
Sobre a bagagem, afirmou que a mesma ficou no bagageiro da ônibus, e a passageira foi devidamente informada que seus pertences seguiriam para Marília, bem como foram devidamente entregues à ela, que se recusou a assinar recibo de quitação no momento da retirada, exigindo que fosse emitido recibo simples. Nega que tenha havido falha na prestação de seus serviços, o que afasta seu dever de indenizar a autora pelos danos que alega ter suportado.
O JUIZ DECIDIU
"Pois bem! A relação existente entre as partes caracteriza-se como de consumo, de modo que a matéria posta a exame nestes autos será analisada com base na legislação consumerista. Sendo consumerista a relação existente entre as partes, a ré pode ser responsabilizada por prejuízos ocasionados aos consumidores independentemente da existência de culpa, conforme preceitua o artigo 14 do CDC.
Aplica-se também o Código Civil, pois os artigos 730 a 742 regem os contratos de transporte de passageiros. O artigo 734 do Código Civil dispõe que o transportador responde pelos danos causados às pessoas transportadas e suas bagagens, salvo motivo de força maior, sendo nula qualquer cláusula excludente da responsabilidade.
No caso em tela, a questão central está em determinar se houve falha na prestação do serviço pela requerida, especificamente quanto ao dever de conferência dos passageiros antes da partida do veículo da parada, e se a conduta da autora ao embarcar em outro ônibus caracteriza culpa exclusiva capaz de elidir a responsabilidade da transportadora.
Neste sentido, verifico que a requerida não logrou demonstrar a ocorrência de culpa exclusiva da consumidora. Embora tenha alegado que o motorista realizou os procedimentos de conferência dos passageiros e aguardou o tempo regulamentar na parada, não trouxe aos autos provas convincentes dessas alegações.
O manual de procedimentos da própria requerida, juntado aos autos, estabelece expressamente que é responsabilidade do motorista"(...) Verifique também as Cartas de Horário e próximas paradas, evitando "esquecer" passageiros em agências, paradas de refeições e rodoviárias, ou levando-os para outras cidades. (...)", bem como "a responsabilidade de verificar com o agente sobre as demais localidades de embarque é sua".
A confissão da autora em ligação ao SAC de que "(...) a respeito que eu saí de Castro, e a gente parou no restaurantão enorme, não lembro o nome da cidade, para comer, aí eu peguei o ônibus errado, como faço para pegar minha bagagem assim? (...)" não caracteriza, por si só, culpa exclusiva, pois este embarque equivocado pode ter sido consequência do abandono prévio, e não sua causa primária.
A autora, ao perceber que o ônibus no qual viajava havia partido sem ela, encontrando-se desamparada em local desconhecido, embarcou no único veículo disponível como tentativa de buscar orientação e não ficar completamente abandonada.
Outrossim, a autora comprovou ter passado a madrugada na rodoviária de Piraí do Sul/PR, em condições precárias, sem qualquer assistência da requerida, precisando retornar por conta própria a Castro/PR no dia seguinte para tentar solucionar a situação.
A empresa somente providenciou nova passagem quando a autora já havia se deslocado à cidade de origem do percurso, demonstrando clara omissão no dever de assistência imediata.
O conjunto dos fatos narrados configura indubitável dano moral, ultrapassando o mero dissabor cotidiano ou simples descumprimento contratual. A autora foi submetida a uma série de transtornos graves: abandono em local desconhecido; pernoite em condições precárias, sem acesso adequado a banheiro, situação agravada pelo fato de estar em tratamento de cálculo renal; prolongamento da viagem por dois dias; privação de seus pertences por período considerável e constrangimento ao ser coagida a renunciar a direitos para reaver sua bagagem.
Ante o exposto, julgo procedente a pretensão autoral e o faço para condenar a ré ao pagamento, em favor da autora, de indenização por danos morais de R$ 10.000,00, a partir da data da sentença, por se tratar de arbitramento, e acrescido de juros... Sucumbente, arcará a ré com o pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios que fixo em R$ 2.500,00".
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