O ex-prefeito de Vera Cruz, Antonio Rodolfo Devito e Valter Pelegrine Júnior, proprietário da empresa GPS Total Saúde, foram condenados em Ação Civil de Improbidade Administrativa e Dano ao Erário, por contrato sem licitação. O ato ocorreu na gestão 2001/2004.
Os condenados devem ressarcir os cofres públicos em valores atualizados, pagarão multas e ficarão com os direitos políticos suspensos por 8 anos. A decisão é do juiz Jamil Ros Sabbag, da 4ª Vara Cível do Fórum de Marília e cabe recurso.
O CASO
Conforme denúncia do Ministério Público Estadual, em abril de 2004 o então prefeito Devito assinou contrato de prestação de serviços na área da saúde com a empresa GPS, sem o devido procedimento licitatório, o que teria causado prejuízo ao Erário Público de R$ 94.132,00 decorrente de superfaturamento estimado em 43,48% em relação aos gastos anteriores com convênios na área da saúde.
Devito negou as irregularidades e alegou "necessidade de contratação emergencial". A empresa apontou "ausência de dolo específico, inexistência de prejuízo ao erário já que o serviço de saúde teria sido efetivamente prestada e que a contratação não foi superfaturada, vez quer o aumento dos gastos foi compensatório pelo incremento de serviços.
O MPE rejeitou as alegações e sustentou que "a conduta de Devito demonstra dolo ao manipular o encerramento de convênios e que os atos foram cometidos com a participação efetiva dos contratados e que a auditoria do Tribunal de Contas confirmou superfaturamento de 43,48%.
O JUIZ DECIDIU
"Todo o conjunto probatório produzido no curso do processo revelou de modo inquestionável que o contrato realizado entre as partes não observou os preceitos legais, violando os princípios da Administração Pública. O dolo específico em realizar ato para frustrar a licitude de processo licitatório pelo então prefeito Antonio restou cabalmente comprovado pelo documento por ele manuscrito com o fim de que seu conteúdo fosse transformado em notificação de rescisão dos convênios anteriores, configurando simulação deliberada para fraudar o procedimento licitatório.
Embora o requerido Antonio tenha justificado a dispensa da licitação pela urgência, já que se tratava de garantia de direito fundamental, tal situação foi comprovadamente simulada e, com auxílio dos contratados, a Câmara Municipal foi induzida a aprovar do Projeto de Lei nº 11/2004 o que ocorreu em 06/05/2004. Esta conduta evidencia a "vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado", nos exatos termos exigidos pela Lei 14.230/2021.
Ademais, a Lei Municipal nº 2.496/2004 foi editada posteriormente à contratação (fls. 104/108 do IC), revelando o caráter doloso da dispensa irregular de licitação. Corrobora a assertiva, ainda, o fato de que após a publicação da lei referida, as partes minutaram novo contrato alterando, apenas, a data da assinatura, que passou a ser 07 de maio de 2004.
Com efeito, o dolo dos requeridos GPS e Valter Pelegrine Júnior manifesta-se em múltiplas condutas: a empresa e os profissionais não serem localizados nos endereços fornecidos, demonstrando intuito de dificultar fiscalização; a contratação ser anterior à lei municipal autorizadora; a empresa ter contratado profissionais antes mesmo da assinatura do contrato com a publicação de vagas de empregos no jornal de 29 de abril de 2004, evidenciando o ilegítimo acordo prévio.
Deveras, Valter Pelegrine Júnior praticou atos decisórios em nome da pessoa jurídica sem exibir instrumento de mandato, quando a empresa era efetivamente gerenciada por Marcelo Viveiros Pelegrine.
Ademais, o contrato social da empresa indicava expressamente: “a sociedade se organiza para exploração do ramo de comércio de produtos hospitalares e prestação de serviços de LIMPEZA, SEGURANÇA. LAVANDERIA E ALIMENTAÇÃO”.
A alteração do contrato social da empresa no qual indicou que a sociedade passaria a prestar serviços hospitalares data de 03 de maio de 2004, com registro na Junta Comercial do Rio de Janeiro somente em 21/05/2004. Assim, considerando que o registro da empresa no órgão competente possui natureza constitutiva, a sociedade somente estaria apta a prestar serviços hospitalares a partir de 21/05/2004, muito tempo depois da assinatura do contrato com o Município de Vera Cruz.
As práticas acima descritas, que foram inequivocamente perpetradas pelos requeridos, são, de fato, ilegais, vez que levadas a efeito sem a observância da legislação.
A auditoria do Tribunal de Contas comprovou superfaturamento de 43,48% em relação aos gastos anteriores, resultando em prejuízo de R$ 94.132,00. O Acórdão lavrado pelo Tribunal de Contas considerou irregulares a dispensa da licitação, o contrato e o termo de aditamento. A dispensa irregular de licitação frustrou o caráter competitivo que assegura a isonomia entre os licitantes e a seleção da proposta mais vantajosa para a Administração, violando frontalmente o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal e os arts. 2º e 3º da Lei 8.666/93. E não é só. A simulação para justificar situação emergencial, mediante manipulação dos convênios anteriores, agrava a conduta ímproba e demonstra o dolo específico dos requeridos...
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO em face de ANTONIO RODOLFO DEVITO, GPS TOTAL SAÚDE GERENCIAMENTO, COMÉRCIO E SERVIÇOS HOSPITALARES LTDA e VALTER PELEGRINE JÚNIOR e o faço para:
(i) DECLARAR a nulidade do contrato de prestação de serviços de saúde celebrado em abril de 2004 entre o Município de Vera Cruz e a empresa GPS TOTAL SAÚDE;
(ii) CONDENAR solidariamente os requeridos ao ressarcimento integral do dano causado ao erário no valor de R$ 94.132,00 (noventa e quatro mil, cento e trinta e dois reais), a correção monetária deve ser calculada segundo o índice IPCA-E, desde a data em que os valores foram pagos pelo ente, e juros de mora a partir da citação segundo a remuneração da Caderneta de Poupança, na forma do art. 1º-F da Lei nº. 9.494/97.
A partir de 09/12/2021 deverá ser aplicada exclusivamente a TAXA SELIC nos termos do art. 3º da EC nº 113/2021.
(iii) APLICAR as seguintes sanções, nos termos do art. 12, inciso II, da Lei 8.429/92: A ANTONIO RODOLFO DEVITO: perda da função pública, se a estiver exercendo; suspensão dos direitos políticos por 8 anos; multa civil equivalente ao dano; proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos;
A GPS TOTAL SAÚDE GERENCIAMENTO, COMÉRCIO E SERVIÇOS HOSPITALARES LTDA: multa civil equivalente ao valor do dano, proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 8 (oito) anos;
A VALTER PELEGRINE JÚNIOR: multa civil equivalente ao valor do dano, proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos;
Após o trânsito em julgado, façam-se as devidas comunicações, lançando-se as informações pertinentes no Cadastro Nacional dos Condenados por ato de improbidade administrativa, bem como oficie-se à Justiça Eleitoral comunicando da suspensão dos direitos políticos".
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