J. POVO- MARÍLIA
Juíza aponta "violência e frieza extrema" de homem que matou o namorado na Zona Oeste de Marília

Sentença da juíza Josiane Patrícia Cabrini Martins Machado, da 1ª Vara Criminal do Fórum de Marília, ressaltou a "violência e frieza extrema" de um homem acusado de matar o namorado em apartamento na Zona Oeste de Marília. Ele deu soco, derrubou a vítima, bateu com peça de bronze na cabeça e desferiu golpe de faca no pescoço da vítima com tamanha força que causou esgorjamento (quase uma degola).
"O dolo empregado pelo réu foi intenso, excedendo a previsibilidade da norma, tudo a corroborar o maior grau de reprovabilidade da conduta. Afinal, o acusado primeiro golpeou a vítima com um objeto contundente (segundo o próprio réu, um soco) e, na sequência, já com ela prostrada e sem condições de qualquer reação, não contente, renovou o ataque, desferindo-lhe um golpe com faca no pescoço, golpe tão profundo que atingiu a coluna e causou o esgorjamento de Daril. Frise-se que o relato que se fez até o momento apenas demonstra traços da personalidade do acusado (frieza extrema), sua péssima conduta social, o excesso de dolo e a maior reprovabilidade da conduta", citou a magistrada na sentença.
Ela acatou decisão do Júri e condenou João Paulo de Melo, de 34 anos, a cumprir mais de 23 anos de reclusão pelo brutal assassinato do namorado, o aposentado Daril Gomes, de 61 anos, em abril de 2018 no Condomínio San Remo, no Jardim Califórnia, Zona Oeste de Marília.
Do total da pena, 2 anos e 6 meses são por furtos praticados pelo réu, que está preso e não poderá recorrer em liberdade.
O CASO
Daril Gomes morava há 12 anos com o réu, com quem mantinha um relacionamento amoroso. Vizinhos chamaram a Polícia Militar por volta das 14h do dia 28 de abril de 2018, informando que de um dos apartamentos estava exalando forte cheiro. Quando a equipe da PM chegou no local um chaveiro já tentava abrir a porta.
O corpo, com um profundo corte no pescoço, já em início de decomposição foi encontrado deitado na cama de um dos quartos com o travesseiro sobre o rosto.
Sobre o sofá da sala os policiais encontraram a CNH de João Paulo, além de um caderno com a palavra “perdão”.
Testemunhas relataram que o companheiro de Daril foi visto saindo do condomínio com o carro do aposentado, um Volkswagen Crossfox, na manhã de domingo (22). O veículo foi abandonado em uma bairro na Zona Sul da cidade. O corpo do aposentado foi encontrado três dias depois. O acusado foi preso no dia seguinte no Parque das Azaleias, na Zona Sul.
Ele confessou o crime, disse que morava com o aposentado no apartamento e, por motivos íntimos, teriam se desentendido na noite de 20 de abril, uma sexta-feira, cinco dias antes da localização do corpo.
João Paulo passou, então, a consumir crack continuamente, até que na madrugada do dia seguinte (21), sábado, disse ter ido até o quarto de Daril.
Após uma breve discussão, a vítima foi golpeada na cabeça com uma escultura de cerâmica e madeira. Em seguida foi desferida a facada no pescoço da vítima.
Mesmo com Daril morto no apartamento, o acusado permaneceu no local consumindo crack até a manhã de domingo (22). Durante a fuga, João Paulo utilizou cartões de crédito e débito do aposentado morto.
A SENTENÇA
"O acusado João Paulo de Melo foi submetido a julgamento pelo Egrégio Tribunal do Júri desta Comarca. O Conselho de Sentença reconheceu que o réu praticou o crime de homicídio duplamente qualificado que lhe foi imputado, bem como os crimes de furto descritos na inicial.
Em razão desta decisão, passo a dosar a pena a lhe ser imposta. Uma vez que as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal se mostram desfavoráveis ao acusado, a pena-base do crime de homicídio qualificado pelo recurso que dificultou a defesa da vítima será fixada acima do mínimo legal. Ora, as circunstâncias do crime, cometido com extrema violência no ataque, totalmente desarrazoado, demonstra o total menosprezo que o réu tem pela vida alheia, inclusive de pessoa com quem conviveu por aproximadamente doze anos e que, segundo suas próprias declarações, apenas o ajudou durante o tempo de relacionamento, apesar do envolvimento de João com o crime e entorpecentes (o que demonstra conduta social desvirtuada, aliás).
Evidente também que o dolo empregado pelo réu foi intenso, excedendo a previsibilidade da norma, tudo a corroborar o maior grau de reprovabilidade da conduta.
Afinal, o acusado primeiro golpeou a vítima com um objeto contundente (segundo o próprio réu, um soco) e, na sequência, já com ela prostrada e sem condições de qualquer reação, não contente, renovou o ataque, desferindo-lhe um golpe com faca na região do pescoço, golpe tão profundo que atingiu a coluna e causou o esgorjamento de Daril.
Frise-se que o relato que se fez até o momento apenas demonstra traços da personalidade do acusado (frieza extrema), sua péssima conduta social, o excesso de dolo e a maior reprovabilidade da conduta, tudo a autorizar o aumento da pena na primeira fase de aplicação, ou seja, na fixação da pena-base.
Assim, pelo até aqui exposto, aumento a pena-base do homicídio qualificado pelo recurso que dificultou a defesa da vítima em 1/4 (um quarto), restando ao réu o cumprimento de 15 (quinze) anos de reclusão. Na segunda fase da dosimetria, presente a atenuante da confissão, muito embora qualificada. Como se trata de homicídio duplamente qualificado, o motivo torpe será utilizado como agravante de pena, na segunda fase da fixação, conforme previsão específica no artigo 61, incisos II, alíneas “a”, do Código Penal. Ainda, presentes as circunstâncias agravantes da reincidência (artigo 61, inciso I, do Código Penal – fls.684/686), de ter, o agente, cometido o crime prevalecendo-se das relações domésticas (artigo 61, inciso II, alínea “f”, do Código Penal) e, ainda, contra maior de 60 (sessenta) anos (artigo 61, inciso II, alínea “h”, do Código Penal). Assim, fazendo a compensação da confissão com a circunstância prevista na alínea “f” do inciso II do artigo 61 do Código Penal, aumento a pena em 1/6 (um) sexto para cada uma das demais agravantes (três), em um total de 1/2 (metade), restando ao réu o cumprimento de 21 (vinte e um) anos e 6 (seis) meses de reclusão. Neste ponto, apenas observo que a condição da vítima ser maior de 60 (sessenta) anos é, em verdade, para a melhor doutrina, causa que autorizaria o aumento da reprimenda na terceira fase de fixação em 1/3 (um terço), conforme § 4º do artigo 121 do Código Penal. Ocorre que, no caso concreto, foi utilizada como agravante, na segunda fase, porque, para o reconhecimento na fase seguinte, necessário que constasse da sentença de pronúncia (por consequência, do acórdão que a confirmou), o que possibilitaria, então, a devida quesitação. Havendo omissão, impossível utilizá-la na terceira fase de fixação da pena privativa de liberdade. Assim, não vislumbro causas de aumento ou diminuição de pena a incidirem nesta fase da dosimetria. Quanto aos crimes de furto, na primeira fase de aplicação da pena, nada a considerar. Assim, fica no mínimo legal a sanção a ser cumprida pelo acusado: 1 (um) ano de reclusão para cada um dos furtos cometidos. Na segunda fase da dosimetria, aumento a pena em ½ (metade), sendo 1/6 (um sexto) para cada uma das seguintes circunstâncias agravantes: a reincidência, ser, a vítima, maior de 60 (sessenta) anos e ter, o agente, cometido o crime prevalecendo-se das relações domésticas (artigo 61, inciso I e II, alíneas “f” e “h”, do Código Penal), restando, assim, o cumprimento de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão para cada um dos crimes de furto. Ausentes atenuantes. Na terceira fase, ausentes causas de diminuição de pena. Na forma do artigo 71 do Código Penal, porque os crimes de furto foram cometidos nas mesmas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem, os subsequentes, ser havidos como continuação do primeiro. Assim, aumento a pena de um deles, porque idênticas, em 2/3 (dois) terços, em virtude da quantidade de delitos cometidos, restando o cumprimento de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão. A pena pecuniária, utilizados os mesmos critérios da privativa de liberdade, é fixada em 25 (vinte e cinco) dias-multa, cada qual unitariamente em um trigésimo do salário-mínimo, reajustados a partir da data do fato, critério previsto no artigo 49, § 2º, do Código Penal. Os crimes de homicídio e furto foram cometidos na forma do artigo 69 do Código Penal, motivo pelo qual devem, as penas impostas, serem somadas. Conforme os critérios previstos no artigo 33 e seguintes do Código Penal, observando-se a reincidência e o quantum de penas privativas de liberdade aplicadas, fixo, como regime inicial de cumprimento da pena de reclusão, o fechado. Deixo de fixar valor mínimo para reparação de eventuais danos causados pelo homicídio, conforme prevê o artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, eis que não há prova do prejuízo exato causado à família da vítima. Já quanto ao crime de furto, fixo como valor mínimo de reparação R$8.743,62 (oito mil, setecentos e quarenta e três reais e sessenta e dois centavos). Atenta ao teor da Lei 12.736/12, que incluiu o § 2º ao artigo 387 do Código de Processo Penal, a detração de penas, com a consequente progressão de regime, deverá ser oportunamente analisada em sede de execução penal, no Juízo competente para tal, com base na guia de recolhimento, na folha de antecedentes e nas informações carcerárias do condenado (inclusive atestado de conduta, a ser expedido pelo Diretor do estabelecimento prisional em que se encontra), após a realização dos devidos cálculos. Ainda, em sendo a reincidência a circunstância preponderante para a fixação do regime inicial de cumprimento de pena, afasta-se a imediata aplicação do dispositivo em comento. Ante o exposto, em respeito à decisão do E. Conselho de Sentença da Comarca de Marília, condeno João Paulo de Melo como incurso no artigo 121, § 2º, incisos I e IV, c.c. artigo 61, incisos I e II, alíneas “a”, “f” e “h”, do Código Penal, ao cumprimento da pena de 21 (vinte e um) anos e 6 (seis) meses de reclusão, em regime inicial fechado. Ainda, condeno João Paulo de Melo como incurso no artigo 155, caput, do Código Penal, por oitos vezes, na forma do artigo 71 do mesmo diploma legal, à pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão, no regime inicial fechado, e ao pagamento de 25 (vinte e cinco) dias multa, cada qual no valor mínimo. Em respeito ao estabelecido no artigo 387, § 1º, do Código de Processo Penal, entendo que continuam presentes as circunstâncias cautelares anteriormente reconhecidas na decisão que decretou a prisão preventiva do acusado, bem como nas que a mantiveram, motivo pelo qual nego ao réu o recurso em liberdade. Recomende-se na prisão em que se encontra recolhido. Transitada em julgado, comunique-se ao Egrégio Tribunal Regional Eleitoral deste Estado, para o fim previsto no artigo 15, inciso III, da Constituição da República, e ao Instituto de Identificação Ricardo G. Daunt. Registre-se e cumpra-se. DOCUMENTO ASSINADO DIGITALMENTE".

