Um morador do Jardim Flamingo, na Zona Oeste de Marília, processado sob acusação de fazer aglomeração em festa com familiares sm máscaras na calçada de sua casa, foi absolvido em sentença do juiz Paulo Gustavo Ferrari, da 2ª Vara Criminal do Fórum de Marília.
"Não restou demonstrada de forma inequívoca a configuração do crime ou a violação, inclusive, de eventual Decreto expedido pelo próprio Município, pois caberia ao órgão responsável apurar se a conduta do réu colocou em perigo a saúde de um número indeterminado de pessoas ou se houve séria possibilidade de introdução e propagação de doença contagiosa ao infringir o “toque de recolher”, cita a decisão.
O CASO
A Ação por Infração de Medida Sanitária Preventiva cita que A.F.S.J foi denunciado como incurso no artigo 268, caput, do Código Penal, porque no dia 3 de abril de 2021, por volta das 23h, no Rua João Andrade Guilaumon, infringiu determinação do poder público, destinada a impedir propagação da doença contagiosa denominada COVID-19.
Ainda, segundo a denúncia, o denunciado realizava uma festa na calçada em frente à sua casa. Por meio desse evento, ele provocou uma aglomeração de pessoas, todas sem máscara de proteção.
O réu foi citado. Na audiência designada, sem setembro do ano passado, a denúncia foi recebida. Durante a instrução, foram ouvidas duas testemunhas de acusação e interrogado o réu.
O Ministério Público requereu a procedência da ação, nos termos da denúncia. Na dosimetria, deve-se levar em consideração na primeira fase os maus antecedentes do réu. Na segunda fase há de se mencionar a agravante da reincidência e atenuante da confissão. Em razão da reincidência o regime deve ser o semiaberto.
DEFESA
Já a defesa pleiteou a absolvição com fundamento no artigo 386, III, do Código de Processo Penal (não constituir o fato infração penal) em razão da atipicidade da conduta já que incabível a utilização das normas relacionadas à pandemia para integrar a figura típica do artigo 268 do Código Penal.
O JUIZ DECIDIU
"A acusação é improcedente. Apesar da denúncia estar alicerçada no boletim de ocorrência e registro de ocorrência, concluo que as provas coligidas em Juízo acerca dos fatos não são suficientes para embasar o decreto condenatório.
A testemunha Cabo Júlio, policial militar, declarou que estava em serviço quando foi acionado para atender a uma ocorrência de perturbação de sossego.
No local dos fatos ocorria uma festa, com cerca de 12 pessoas na calçada, em cadeiras e mesas. Além da perturbação, vigiam regras para evitar a propagação do Covid-19, razão pela qual orientaram o réu a encerrar a festa. Contudo, posteriormente, passaram novamente no local e verificaram que a aglomeração persistia, razão pela qual foi lavrado o boletim de ocorrência.
A testemunha Luciano Rocha Villela declarou que, por pertencer ao setor de vigilância sanitária da Prefeitura, recebeu uma ligação da Polícia Militar para conversar sobre possível desrespeito às regras de combate à propagação do COVID-19.
Esclareceu que na época o Estado de São Paulo estava na fase vermelha, razão pela qual havia vedação a aglomerações e a permanência de pessoas na via pública após as 20h00.
O autor do fato declarou que na data dos fatos estava realizando um churrasco com sua família, na calçada da sua casa. Havia cerca de 12 pessoas, incluindo crianças. Às 15h00 os policiais passaram pelo local e ele disse que iria abaixar o volume do som. Eles retornaram às 19h30 e disseram que havia aglomeração no local, razão pela qual lavraram o boletim de ocorrência.
A prova oral coligida em Juízo revela que o acusado realizava uma festa na calçada, em frente a sua residência, da qual participavam em torno de 12 pessoas da família, entre adultos e crianças.
A ocorrência foi lavrada às 22h46min. Apesar da denúncia descrever que o réu promoveu aglomeração de pessoas, todas sem máscara, infringindo Decreto Estadual nº 64.881/2020 e Deliberação, de 3-4-2020, do Comitê Administrativo Extraordinário Covid-19, que colocava o Estado de São Paulo na “Fase Vermelha” e determinava toque de recolher das 20h00 às 05h00, os documentos colacionados, destacando àquele (fase vermelha: 12 a 18 de abril), revelam dúvida sobre quando efetivamente instalou-se a fase de restrição e se os fatos apurados estão compreendidos na sua vigência já que datados de 3 de abril.
Além disso, embora comunicado sobre a situação, o funcionário da Vigilância Sanitária limitou-se a passar informações por telefone e não lavrou auto de infração, especificando as eventuais violações cometidas pelo réu ou tomou qualquer outra medida imediata, deixando ao encargo da Polícia Militar a finalidade de informar o descumprimento do Decreto. A
A despeito dos fatos relatados, não restou demonstrada de forma inequívoca a configuração do crime ou a violação, inclusive, de eventual Decreto expedido pelo próprio Município, pois caberia ao órgão responsável apurar se a conduta do réu colocou em perigo a saúde de um número indeterminado de pessoas ou se houve séria possibilidade de introdução e propagação de doença contagiosa ao infringir o “toque de recolher”.
A par disso, o réu afirma que participavam da festa apenas seus familiares, ou seja, pessoas do próprio convívio, tornando ainda mais frágil a prova de violação do bem jurídico tutelado pela norma penal.
Desta forma, a prova coligida aos autos e reproduzida em Juízo não embasa com a certeza necessária os fatos descritos na denúncia, sendo inevitável a absolvição do acusado com base no princípio do in dubio pro reo.
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE a acusação, para ABSOLVER o réu pela prática do crime tipificado no artigo 268 do Código Penal, o que faço com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. Com o trânsito em julgado e as comunicações de praxe, arquivem-se os autos. P.R.I.C. DOCUMENTO ASSINADO DIGITALMENTE".
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