A Prefeitura de Vera Cruz, sob a gestão do prefeito Rodolfo Davoli, foi condenada por manter servidores em situação degradante de trabalho e riscos à saúde. A ação judicial que resultou nesta decisão (veja abaixo) foi ajuizada em junho de 2019, na gestão da ex-prefeita Renata Devito (2016/2020).
"Os trabalhadores bebem a água in natura, tomam suas refeições de forma precária e fazem suas necessidades fisiológicas no mato", citam os autos.
A condenação obrigou o Município a fazer em até um mês a adaptação de refeitório e sanitário no local de trabalho de servidores que atuam no setor de mina e caixa d’água daquela cidade.
Também deverá pagar R$ 5.000,00 de indenização a título de danos morais para o servidores prejudicados. A condenação determinou ainda multa diária de R$ 1 mil, caso não cumpra a determinação judicial.
DANOS À SAÚDE DO TRABALHADOR
"A precariedade do ambiente laboral é visível. Com efeito, a inobservância das regras mínimas de higiene e saúde no ambiente laboral expõe o empregado a situações degradantes, gerando constrangimento e danos à saúde do trabalhador" citou o juiz Walmir Idalêncio dos Santos Cruz, da Vara da Fazenda Pública do Fórum de Marília. Cabe recurso à decisão.
O CASO
Os servidores ajuizaram a ação contra o Município de Vera Cruz, alegando em síntese, que são servidores públicos municipais e desempenham suas funções junto ao “setor da caixa e mina d’água”, todos há mais de cinco anos. Afirmaram que no local não existe banheiro ou qualquer local adaptado para que os servidores façam suas necessidades fisiológicas, não existe refeitório apropriado para se alimentarem e as mínimas condições ali existentes foram improvisadas pelos próprios servidores.
"Assim, diante do descaso do município, buscaram a tutela jurisdicional para fins de, em caráter liminar, seja determinado à requerida que proceda a adaptação de refeitório e sanitário no local de trabalho dos peticionários (construindo ou adaptando sanitário biológico móvel no “setor de mina e caixa d’água), permitindo aos requerentes o mínimo de dignidade e saneamento...", citam os autos.
Devidamente citada, a Prefeitura deixou de apresentar contestação no prazo legal. Foi anexado laudo pericial na ação.
O JUIZ DECIDIU
"Com a não apresentação de contestação pelo ente público, conforme certidão de fls. 550, decreto-lhe a revelia, com lastro no artigo 344 do Código de Processo Civil, mas sem a presunção de veracidade dos fatos articulados, dada a indisponibilidade do direito debatido (artigo 345, inciso II, do mesmo Código).
No mérito, os pedidos são procedentes. O conjunto probatório constante dos autos (prova documental, pericial e testemunhal) indica que no desempenho de suas funções, os autores não tem acesso a sanitários, bem assim à refeitório.
Consta do laudo pericial que não há fornecimento de água potável, não existe refeitório nem sanitário. Os trabalhadores bebem a água in natura, tomam suas refeições de forma precária e fazem suas necessidades fisiológicas no mato, longe do local da coleta de água da mina.
E ainda: O local de trabalho para as atividades desenvolvidas pelos requerentes não atendem os requisitos mínimos previstos na Norma Regulamentadora nº 24 – Condições Sanitárias e de conforto nos locais de trabalho.
Não foram encontradas condições de insalubridade ou de periculosidade nas atividades dos trabalhadores, entretanto, a precariedade do ambiente laboral é visível. Com efeito, a inobservância das regras mínimas de higiene e saúde no ambiente laboral expõe o empregado a situações degradantes.
Seguramente que a ausência de banheiro submete o empregado a cenários constrangedores e humilhantes, pois este se vê obrigado a satisfazer as necessidades fisiológicas "no mato", conforme restou demonstrado através da prova oral produzida nos autos. Além do constrangimento de ter que satisfazer suas necessidades fisiológicas em local impróprio para tanto, muitas vezes, por conta desta situação, o servidor vê-se na necessidade de evitar a ingestão de líquidos, o que acarreta, indubitavelmente, danos à saúde do empregado.
A situação não é diferente com relação à ausência de refeitório adequado, gerando constrangimento e danos à saúde do trabalhador. O atendimento da exigência de providenciar instalações adequadas para as necessidades fisiológicas dos servidores está perfeitamente ao alcance da parte empregadora, ora requerida.
Fácil perceber o quanto é incômodo, desconfortável e até mesmo perturbador a premência de atendimento de necessidades fisiológicas, sobre as quais a mente do servidor não possui total controle, e não encontrar meios e local adequado para tanto prolonga uma situação que contraria a natureza do corpo humano e pode gerar dores, além de outros males. Destarte, os fatos narrados na inicial ferem a dignidade da parte postulante, de modo que está configurado o dano moral alegado, nos termos do artigo 186 do Código Civil.
No que se refere ao quantum da indenização que será fixada no dispositivo há que se considerar tanto as circunstâncias em que o ato ofensivo foi praticado (deixar de fornecer condições mínimas de trabalho), além da capacidade econômica da parte requerida. É preciso sopesar, ainda, o aspecto pedagógico que visa desestimular o ofensor a reiterar condutas análogas (teoria do desestímulo), além da necessidade de evitar enriquecimento sem causa. No exercício do prudente arbítrio judicial, à míngua de regramento específico para a matéria, fixo o valor da indenização reparatória por danos morais em R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para cada um dos autores, montante que tenho por suficiente e adequado para, a um só tempo, desestimular a reiteração da conduta ilícita pelo requerido e evitar o enriquecimento sem causa do autor da ação.
Isto posto, na forma do que dispõe o artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTE OS PEDIDOS, a fim de determinar à requerida que proceda a adaptação de refeitório e sanitário no local de trabalho dos autores (setor de mina e caixa d’água).
Outrossim, condeno o requerido a pagar a cada um dos requerentes, a título de danos morais, a quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), com atualização monetária e juros moratórios pela taxa SELIC (artigo 3º da EC nº 113/2021), a partir da presente data (Súmula nº 362 do C. STJ) até o efetivo pagamento.
Presentes os requisitos do artigo 300 do CPC, concedo a tutela de urgência e fixo o prazo de um mês, a contar da intimação desta sentença, para o cumprimento das obrigações de fazer aqui determinadas, sob pena de incidência de multa diária, ora fixada em R$ 1.000,00, em caso de descumprimento".
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