Motorista de um microônibus de transporte de presos que causou acidente ao "cortar" a frente de uma motocicleta na SP-294 (em frente a Penitenciária de Marília), foi condenado a pagar indenizações de R$ 80 mil por danos materiais, morais e estéticos e pensão mensal de 70% do salário mínimo à vítima, condutora da moto que teve a perna direita amputada, até que ela complete 75 anos de idade. A decisão é da juíza Caroline Silva Lisboa, da 1ª Vara do Fórum de Pompeia e cabe recurso à decisão.
Uma campanha promovida pela igreja católica e comunidade, ajudou a vítima, Kellen Melissa Gaspar de Oliveira, de 28 anos, a Mel, moradora em Quintana, a comprar uma prótese da perna amputada.
Kellen conseguiu uma prótese da perna amputada em campanha da igreja e comunidade
O CASO
Conforme os autos, o motorista de um microônibus Marcopolo/Volare, ano 2002, pertencente à empresa FR Transportes, no dia 15 de março de 2019, por volta das 17h30, deixou presos do semiaberto no bolsão de acesso à Penitenciária de Marília e ao fazer o "balão" na rodovia (de forma irregular) "cortou" a frente da motocicleta Honda CG 125, FAN KS, ano 2001, cor prata, conduzida por Kellen Melissa Gaspar de Oliveira, de 28 anos, moradora em Quintana.
Kellen sofreu fratura de acetábulo direito, de falange proximal de quarto dedo da mão direita com lesão tendínea extensora e amputação traumática da perna direita e ficou dois meses internada no Hospital das Clínicas de Marília, se recuperando.
DEFESA
Os advogados da empresa alegaram que a mesma não presta serviços para o Estado de São Paulo, mas sim realiza transporte escolar para o Município de Pompéia. Narraram que no dia dos fatos o motorista A.Z.F dirigiu-se à Marília para buscar uma peça automotiva, porém, na entrada da cidade recebeu um pedido de ajuda de alguns conhecidos para levá-los até a penitenciária, se não corriam o risco de ter seu regime regredido. Afirmaram que o motorista deu a "carona" e retomou o seu trajeto, quando sofreu o impacto da motocicleta da requerida. Explicaram que no dia dos fatos chovia muito, que a requerida trafegava infringindo normas de trânsito, inclusive, se deslocando em sentido contrário. Afirmaram que se os fatos tivessem ocorrido como narrado pela autora a colisão não seria frontal. Ademais, preliminarmente, arguiram inépcia da inicial por não a ter instruído com as provas de suas alegações. Levantaram ainda ilegitimidade passiva da Fazenda Pública e do sócio da empresa requerida. Informaram que não há prestação de serviços para o Estado, que o motorista forneceu uma "carona" a um colega, configurando um transporte gratuito, não havendo, pois, responsabilidade do Estado. Impugnaram o pleito de danos materiais, morais, estéticos e pensão vitalícia. Requereram a suspensão do processo, na forma do art. 313 do CPC. Ao final, pugnaram pelo julgamento improcedente.
A JUÍZA DECIDIU
"De acordo com a prova dos autos tem-se que o evento danoso ocorreu por responsabilidade do motorista demandado, porquanto realizou manobra de forma imprudente e negligente. Isso porque, fez conversão do micro-ônibus que estava dirigindo em local inapropriado para tanto, deixando, ainda de adotar as cautelas necessárias no ato da condução, já que não visualizou o veículo da vítima, de forma que colidiu com o mesmo. Cumpre observar, que ao contrário do alegado em contestação, pelo conjunto probatório dos autos, não há como se depreender que a autora trafegava em sentido diverso. Ademais, ficou evidenciado que o suposto tempo chuvoso não contribuiu para o acidente.
Outrossim, a defesa sustentou que o veículo da autora não estava em bom estado de conservação dos pneus, que o sistema de frenagem estava ruim, que a requerente não usava capacete com viseira adequada e que a demandante trafegava com compras nas mãos, por isso não teve mobilidade para desviar do microônibus.
Contudo, os acionados, não apresentaram nenhuma prova das suas alegações, ônus este que lhes cabia, na forma do art. 373, II do CPC. No mesmo trilhar, a defesa afirmou que o veículo da autora estava com licenciamento atrasado, porém este fato não interfere na responsabilidade dos acionados pelos atos ilícitos cometidos e pelos prejuízos decorrentes dos mesmos.
O laudo descreve os danos sofridos pela autora. Segundo a descrição a requerente apresentou “lesões corporais de natureza GRAVÍSSIMA pela perda ou inutilização de membro inferior direito”.
Quanto ao comportamento do condutor ficou comprovado que ele não fez a conversão no local correto e com isso atingiu a autora, causando-lhe os danos indicados. As testemunhas em audiência foram uníssonas ao afirmarem que o acidente apenas ocorreu porque o motorista do microônibus fez a manobra no local errado da pista de rodagem. Agente penitenciário: "sou agente penitenciário, trabalho na penitenciária de Nóbrega. Eu vi o acidente. Eu estava na frente do presídio (que fica de frente a rodovia), aguardando os presos retornarem do serviço. O microônibus parou para desembarcar os presos, no bolsão que fica do lado direito da pista, de quem de Marília vai para Pompeia. Depois de desembarcar os presos, ele fez o retorno na pista para voltar para marília. A moto da vítima vinha de Marília em direção a Pompeia quando teve a trajetória interceptada pelo microonibus do réu. Eu não conhecia a condutora da moto. Tenho certeza que o condutor do ônibus vinha de Marília em direção a Pompeia. Fiquei revoltado ao saber que ele disse que vinha de Pompeia em direção a Marília".
Outro agente penitenciário: no dia dos fatos, eu estava na portaria do Semiaberto. De lá, há uma janela grande, de onde conseguimos ver a rodovia. Vi que parou um ônibus, que presta serviço para prefeitura de Marília, para desembarcar presos. são vários ônibus que param ali todos os dias para desembarcar presos que prestam serviços para a prefeitura. Depois que o ônibus desembarcou os presos, ele fez o retorno na pista para voltar para Marília. A cerca de 200 metros havia um retorno. Ele não se utilizou do retorno apropriado. Enquanto ele fez o retorno, a condutora da moto, que vinha de Marília colidiu com o ônibus. Eu não vi a colisão, porque foi tudo muito rápido. Logo em seguida, eu correu até a pista. A vítima estava caída do outro lado da pista (sentido Pompeia a Marília). Tenho certeza que ela estava indo na direção Marília-Pompeia. Não conversei com o condutor do microônibus. Ele parou a cerca de 100 metros do local do acidente. Ele não chegou a descer do ônibus.
Ante o exposto, resolvo o mérito, nos termos do art. 487, I do CPC, e, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado por KELLEN MELISSA GASPAR DE OLIVEIRA para condenar solidariamente os réus:
a) ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 40.000,00, com atualização monetária pela Tabela Prática do TJSP a partir desta data (S. 362 do STJ) e juros de mora de 1% ao mês desde o evento danoso (S. 54 do STJ);
b) ao pagamento de indenização por danos estéticos no valor de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), com atualização monetária pela Tabela Prática do TJSP a partir desta data (S. 362 do STJ) e juros de mora de 1% ao mês desde o evento danoso (S. 54 do STJ);
c) ao pagamento de pensão mensal 70% do salário mínimo, desde a data do evento danoso e termo final na data em que a autora completar 75 anos ou até a data do seu falecimento, se este ocorrer primeiro, sendo que as prestações pretéritas deverão ser pagas de uma única vez, acrescidas de correção monetária pela Tabela Prática do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e juros de mora à base de 1% ao mês desde o evento danoso e até a data do efetivo pagamento, enquanto as vincendas deverão ser pagas até o dia 10 (dez) de cada mês, sendo que na hipótese de inadimplemento, incidirá correção monetária pela do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, bem como juros de mora à base de 1% ao mês, desde quando se tornaram devidas. Ainda deverá a parte acionada promover a constituição de capital, na forma da lei;
d) condeno, ainda, o Estado de São Paulo, ao pagamento das indenizações supra, subsidiariamente, na hipótese de insolvência dos corréus, nesse caso, deverá ser observada a regra específica de atualização monetária e incidência de juros em relação à Fazenda Pública, nos termos do Tema 810 do STJ, 905 do STJ e EC 113/2021 a partir de 09/12/21. Em decorrência da sucumbência recíproca, condeno a autora ao pagamento das despesas processuais na proporção de 20% e honorários advocatícios no percentual de 10% sobre o valor da condenação.
Ademais, condeno os réus, ao pagamento de 80% das despesas processuais, bem como ao pagamento de honorários advocatícios à parte autora no percentual de 10% sobre o valor da condenação, observado o critério do art. 85, §§ 2º e 3º do CPC".
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