J. POVO- MARÍLIA
Justiça condena idoso flagrado com CNH falsa na SP-294. Disse que adquiriu o documento em Marília

Um idoso flagrado pela Policia Rodoviária Estadual, conduzindo um veículo com uso de Carteira Nacional de Habilitação (CNH) falsa, pela Rodovia Comandante João Ribeiro de Barros (SP-294), foi condenado a 2 anos de reclusão e teve a pena substituída por pagamento de um salário mínimo á entidade assistencial. A decisão é da juíza Renata Lima Ribeiro, da 1ª Vara Criminal do Fórum de Garça.
Antes de ser abordado na Rodovia, o acusado disse que ficou surpreso, pois já havia passado por diversas abordagens de trânsito e liberado com a mesma CNH. Disse que adquiriu o documento em Marília.
O CASO
Conforme os autos, L.C.M.B, foi denunciado como incurso no artigo 304, combinado com o artigo 297, ambos do Código Penal, porque, no dia 16 de setembro de 2018, por volta das 9h40, próximo a Garça, teria feito uso de documento público falsificado.
Narra a denúncia que o réu conduzia o veículo Hyundai HB20, ocasião em que foi abordado por policiais militares rodoviários que realizavam fiscalização de rotina na mencionada rodovia.
Durante a abordagem, os policiais solicitaram ao réu apresentação de sua Carteira Nacional de Habilitação, a qual apresentava algumas inconsistências, tais como cor do papel, tipos de caracteres e desalinhamento do documento no campo de registro, o que chamou a atenção dos policiais.
Devidamente apreendido o documento e realizado o exame documentoscópico, o Núcleo de Perícias Criminalísticas de Marília concluiu que a Carteira Nacional de Habilitação era falsa...
Em alegações finais, o Ministério Público pugnou pela condenação nos termos da denúncia e fez considerações sobre a dosimetria da pena. A Defesa propugnou pela absolvição, aduzindo, em síntese, que o policial Fernando foi preciso ao afirmar que nenhum leigo poderia detectar a falsidade da CNH; o acusado passou anos sem qualquer problema com a CNH; não haver lembrança de qual o local exato em que realizado exame de vista devido ao decurso de cinco anos; testemunha afirmou haver levado o acusado a um escritório em uma rua determinada para que resolvesse problema de sua carta; inexistência de documento nos autos a indicar que o acusado não fez exame de vista para renovar a CNH, não tendo a acusação se desincumbido do ônus probatório; não veio indicação de não ter havido processo de renovação pelo órgão de trânsito; inexistência de prova de quem teria feito a falsificação e, por fim, que o acusado não se valeu propositadamente de documento falso.
A JUÍZA DECIDIU
"O pedido condenatório é procedente. Materialidade, autoria e elemento subjetivo restaram demonstrados pelo auto de apreensão, laudo e pela prova oral.
De fato, a testemunha Fernando, policial militar rodoviário, disse que estavam realizando operação de fiscalização de trânsito e combate a ilícitos penais, em frente à base operacional de Garça, quando deram sinal de parada regulamentar a um veículo HB20, que era conduzido pelo Sr. Luiz Carlos, sendo solicitado a ele a apresentação da documentação do veículo e também do condutor.
Apresentada a CNH, de imediato chamaram a atenção algumas características que são latentes aos documentos originais e não estavam presentes, havendo diferença na cor no papel, não havia alinhamento do numeral do registro com o caractere que é impresso e que para o Estado de São Paulo obedece a uma ordem. Então, essa tipografia e a fonte chamaram a atenção também.
De imediato, para tirar qualquer dúvida, fizeram a consulta junto à base de dados Prodesp, via base operacional de Marília, constatando-se que não havia registro para aquele condutor. Números de CPF e RG batiam. Havia número antigo de PGU, que perdurou até 1994, mas numeral de registro para CNH não havia.
Questionaram o condutor, tendo ele dito que a habilitação dele estava correta, que ele havia feito a renovação no despachante, no município de Marília, na Rua 4 de abril, mas não se recordava o local e nem o nome do despachante, mas que para ele estava tudo correto.
Não se recorda se ele estava sozinho no veículo, salvo engano havia uma senhora. No momento em que disse a ele que a CNH era falsa, ele se mostrou surpreso e disse que tinha feito a renovação corretamente. Percebeu que a CNH era falsa por sua experiência. Uma pessoa que não tem o contato comum verificaria o documento como bom. Pelo tato percebeu diferença no documento. Um leigo não conseguiria diferenciar.
A testemunha J. disse ser amiga de Luiz Carlos, lembrar-se que ele estava operado e pediu que o levasse a um lugar, na Rua 4 de Abril, para que ele resolvesse sobre a habilitação, pois ele estava sem a carteira de habilitação e não estava dirigindo.
Salvo engano o levou à 4 de Abril, há muito tempo. Disse que parou seu carro em um estacionamento próximo, deixou Luiz, esperou por ele, depois foi embora. Disse não saber exatamente o que ele foi fazer lá, ele só falou que ia resolver negócio da carta dele.
Afirmou que ele estava sem habilitação, não estava dirigindo, por isso pediu que o levasse. Disse não saber dizer se o local era escritório ou despachante. Interrogado, o réu afirmou que no prédio no qual morava havia uma senhora que tinha feito a documentação nesse escritório e tinha dado tudo certo. Foi até esse escritório, levou a documentação de sua secretária e esta se aposentou. Falou no escritório que estava com a carteira de habilitação vencida há muito tempo e precisava renová-la. Ele falou que levasse a documentação, pois faria a renovação.
Afirmou ser habilitado desde 1975 e que não teria motivo para fazer algo ilícito. Pediu a J. que o levasse a esse escritório, pois precisava renovar sua carteira de habilitação. Trabalhava a duas quadras do local de trabalho e até então não precisou renovar a CNH.
Após renovar, comprou um carro zero quilômetro e foi abordado por vários comandos, mas nunca falaram que sua carteira não era verdadeira. No dia em que foi parado pela polícia rodoviária, ficou realmente passado e indignado por saber que não era verdadeira.
Disse que, salvo engano, pagou cento e trinta reais, nada absurdo. Descreveu que, nesse escritório, entregou a documentação a um senhor, já falecido. Era um escritório de contabilidade e despachante.
Referiu que sofreu acidente em 2011 e ficou muito tempo sem memória. Levou o documento e ele renovou. Fez o exame de vista. Já tinha renovado a CNH antes.
Quando renovou sua carteira, fez o exame de vista, mas não se lembra do local. Ainda, disse que nunca tinha feito a renovação de sua CNH nesse local. Transposta a instrução, observa-se que o réu negou a prática delitiva descrita na denúncia.
A negativa do réu, contudo, destoa do conjunto probatório. Trata-se de tipo penal que tutela a fé pública, delito formal que não exige resultado naturalístico.
No caso, as circunstâncias da apreensão do documento foram descritas de forma detalhada pela testemunha Fernando, policial militar rodoviário. Segundo disse, abordou o réu quando ele estava conduzindo veículo automotor e solicitou a apresentação de documentação, tendo ele apresentado a CNH. Asseverou que suspeitou e, realizada consulta à Prodesp, constatou que havia número antigo, até 1994, mas numeral de registro para CNH não havia. Mencionou haver percebido que a CNH era falsa em razão de sua experiência profissional, pois uma pessoa leiga verificaria o documento como bom.
Cuida-se de documento público apto à identificação e à prova de habilitação. Algumas características do documento apenas chamaram a atenção da testemunha Fernando devido ao desempenho de suas funções como policial militar rodoviário.
A propósito, aludida testemunha afiançou haver percebido que a CNH era falsa em razão de sua experiência e que pessoa leiga daria o documento como “bom”.
Note-se que o homem médio é que constitui paradigma para nortear a verificação, porquanto policiais são pessoas treinadas. Além disso, no caso vertente o policial confirmou a contrafação mediante consulta à base de dados sobre o registro da CNH.
O documento apreendido foi submetido à perícia que constatou a contrafação. De fato, constatado que o papel suporte não possui elementos de segurança em conformidade com documentos autênticos oficiais desta natureza, citados ausência de fluorescência em numeração tipográfica sob a ação de luz U.V.; ausência de registro coincidente; ausência de imagem latente “Original”; presença de policromia em toda impressão de fundo; ausência de calcografia em tarja.
O exame documentoscópico foi realizado por perita do Instituto de Criminalística que detém conhecimento técnico e dispõe dos meios necessários, nada tendo sido demonstrado nos autos que infirmasse a prova a qual goza de presunção de veracidade.
Vale sobrelevar que o réu se limitou a negar o conhecimento da falsidade do documento, porém não prestou informações que propiciassem a identificação da pessoa de quem referiu haver adquirido o documento falso.
Afora isso, não forneceu elementos referentes à avença com mencionada pessoa, pagamentos correspondentes e do exame médico para a alegada renovação da Carteira Nacional de Habilitação, nem sequer informou o profissional médico que o teria examinado.
A testemunha arrolada pela Defesa, que disse ter levado o réu para resolver algo sobre a habilitação, também não mencionou a pessoa com quem o réu teve contato, tampouco o endereço de modo preciso, tendo dito que parou seu carro em um estacionamento e deixou o réu.
Ademais, não presenciou tratativas entre tal pessoa e o réu. Diante desse quadro probatório, tem-se, diversamente do que sustentou a Defesa, que a acusação cumpriu o ônus probatório.
Cabe destacar que não ilide a prova reunida nos autos a alegação do réu de que é habilitado desde o ano de 1975 e não teria motivo para fazer algo ilícito, sobretudo porque incontroverso que a CNH estava vencida, sendo desimportante para o desfecho da ação penal o que o teria levado a obter documento contrafeito.
De igual modo, a alegação do réu de que ficou "sem memória" não altera o desate da ação penal, sendo oportuno consignar que a mera alegação não conduz à dúvida sobre prejuízo de suas capacidades intelectiva e volitiva ao tempo do fato, nada tendo sido requerido a esse respeito.
O réu tampouco fez prova de seu álibi, matéria de defesa cuja produção compete a quem aproveita, conforme intelecção do artigo 156 do Código de Processo Penal. Materialidade e autoria bem demonstradas nos autos. Laudo pericial que atestou a falsidade do documento apreendido. Policial militar que confirmou o uso de documento público, cuja inautenticidade foi constatada após pesquisa junto à PRODESP.
Acusado alegou desconhecer a falsidade do documento e asseverou ter renovado sua Carteira Nacional de Habilitação mediante o auxílio de autoescola, cujo nome e endereço exato não soube indicar, tampouco o nome de despachante ou da pessoa que o atendeu no referido local, nem apresentou qualquer documento que possibilitasse a identificação da autoescola.
Versão que, além de inverossímil, não encontra respaldo no conjunto probatório coligido...
Assim, restou evidenciado que o réu efetivamente fez uso de documento falso, havendo perfeita subsunção do fato ao tipo penal do artigo 304 do Código Penal, inexistindo circunstância que exima o réu da responsabilização penal.
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido acusatório e condeno LUIZ CARLOS MARINELLI BERNARDONI, qualificado nos autos, como incurso no artigo 304 combinado com o artigo 297, ambos do Código Penal, à pena de 2 (dois) anos de reclusão, no regime inicial aberto, nos termos do artigo 33, § 2º, alínea “c”, do Código Penal, e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, no valor unitário mínimo legal a ser atualizado, conforme artigo 49, §§ 1º e 2º, do Código Penal.
Substituo a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos de prestação pecuniária de um salário mínimo em favor de entidade pública ou privada com destinação social e 10 (dez) dias-multa (Código Penal, artigo 44, § 2º, segunda parte, c.c. artigos 43, I e 45, § 1º), sem prejuízo da multa originariamente imposta. Ausentes os requisitos para decretação da custódia cautelar, sendo esta incompatível com a pena efetivamente imposta, o réu poderá interpor eventual recurso em liberdade.
Com o trânsito em julgado, expeça-se o necessário para o cumprimento da pena, anote-se a condenação definitiva no sistema informatizado oficial, com as devidas comunicações ao IIRGD, oficie-se ao TRE/SP para fins do artigo 15, III, da Constituição Federal, oficie-se para destruição do documento falso apreendido, arquivando-se os autos, oportunamente, com as comunicações e anotações de praxe. Custas pelo réu, conforme artigo 804 do Código de Processo Penal e artigo 4º, § 9º, da Lei nº 11.608/2003. DOCUMENTO ASSINADO DIGITALMENTE.

