
Um motorista acusado de dirigir embriagado e causar acidente com duas mortes (um casal) e uma vítima grave (filha das vítimas, de 14 anos) além de fugir do local, na SP-333 (próximo ao Posto Gigantão), na zona norte de Marília, foi condenado 5 anos, 3 meses e 16 dias de detenção no regime inicial semiaberto e 10 (dez) dias-multa (R$ 346,00), além da suspensão ou proibição de obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor pelo prazo de 8 meses e 8 dias. O réu poderá recorrer em liberdade. A decisão é do juiz Paulo Gustavo Ferrari, da 2ª Vara Criminal do Fórum de Marília.
O CASO
O ajudante de pedreiro Adailton da Costa Souza, de 46 anos, conduzia um veículo VW Golf, no sentido a Marília pelo referido trecho da Rodovia, por volta das 22h do dia 9 de dezembro de 2017 (um sábado), quando colidiu violentamente na traseira de Chevrolet Corsa, que foi projetado e colidiu de frente com uma carreta que seguia na pista contrária.
Com o impacto, morreram no local, presos às ferragens, Paulo Sérgio de Lima, de 44 anos, e sua esposa Dilce Alves de Lima, 44 anos, além de resultar em ferimentos graves na filha deles, Pâmela, de 14 anos. Ela sofreu traumatismo craniano, fraturas e ficou um mês internada no Hospital das Clínicas de Marília, em recuperação. O casal residia na zona norte de Marília.
Um segundo caminhão, em seguida, também acabou se envolve no engavetamento. Motoristas dos caminhões afirmaram que o motorista do Golf provocou o acidente e fugiu.
PLACA FICOU MARCADA NO PARA-CHOQUE DO CORSA
No local do acidente, a perícia da Polícia Civil conseguiu identificar o número da placa do Golf que ficou marcada no para-choque do Corsa devido ao forte impacto.
Policiais puxaram o endereço do proprietário do Golf e se dirigiram até o local. Ali, foram informados de que o veículo havia sido vendido para Souza, que foi encontrado em sua casa, no bairro César Almeida, zona Norte de Marília, onde o automóvel estava estacionado, com a frente danificada.
Consta nos autos que ele declarou aos policiais aos policiais que tinha ingerido bebida alcóolica durante a tarde, no Country Club. Foi convidado a fazer o teste do ‘bafômetro’ e o aparelho acusou 0,62 miligramas de álcool por litro de ar expelido dos pulmões.
Familiares autorizaram a entrada dos policiais e ele, que estava dormindo, foi abordado no local. Afirmou que se envolveu sim no acidente, mas a colisão já havia acontecido antes disso e portanto não teria sido provocada por ele.
“O Corsa estava parado na faixa de rolagem, sem a devida sinalização, assim [Souza] o atingiu, mas deixou o local quando percebeu que uma viatura havia chegado, imaginando ser o resgate”, constou no Boletim de Ocorrência.
O perito que atendeu o caso diz que o Golf participou do acidente batendo contra a traseira do Corsa, mas não conseguiu afirmar preliminarmente o que deu causa ao ocorrido.
Souza foi liberado no Plantão Policial porque, segundo a Polícia Civil, não haviam provas suficientes em um primeiro momento para a prisão em flagrante.

O casal Paulo Sérgio e Dilce morreu preso às ferragens do Corsa
A SENTENÇA
O magistrado mencionou que Adailton afastou-se do local do acidente, para fugir à responsabilidade penal ou civil que lhe possa ser atribuída. Consta também que, na mesma data e horário, no espaço entre a Rodovia SP 333, e a Rua Álvaro Simões de Paiva, Bairro Costa e Silva, zona sul, ele conduziu veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool.
DEFESA
A defesa do réu pleiteou a absolvição quanto ao delito do artigo 302 do CTB, pela ausência de culpa por parte do acusado, pois não violou norma de cuidado objetivo e o resultado foi fruto de uma fatalidade. Pugnou pelo afastamento da causa de aumento prevista no §1º do artigo 303 do CTB, vez que o réu permaneceu no local e viu a equipe do SAMU chegar e prestar socorro às vítimas. Requereu a absolvição quanto ao delito previsto no artigo 305 do CTB, porque a identificação do réu ocorreu logo em seguida ao acidente, sendo irrelevante o fato de afastar-se do local do acidente, sendo de rigor a absolvição com fundamento no artigo 386, inciso III, do CPP. Finalmente, em relação ao delito de embriaguez ao volante, não há provas de que o acusado fez a ingestão de álcool antes do acidente. De forma subsidiária, pleiteou aplicação do princípio da consunção entre os crimes de embriaguez ao volante e homicídio culposo, sendo àquele crime meio para a ocorrência do delito de homicídio culposo e, por ser menos grave deve ser absorvido pelo mais grave que é o de dano. Ponderou, finalmente, que se a causa de aumento pelo fato de empreender fuga do local e não socorrer as vítimas está sendo aplicada, para evitar “bis in idem” não deve ser punido pelo delito previsto no artigo 305 do CTB, que deve ser absorvido pelo delito mais grave. Em caso de entendimento diverso, requereu seja a pena aplicada no mínimo, além de fixar o regime aberto para início de cumprimento de pena, com a consequente substituição por restritiva de direitos.
FORTE IMPACTO
A vítima Pamela declarou que na data dos fatos estava com seus pais, voltando da casa da avó em Guaimbê/SP. Em certo momento ela sentiu um forte impacto na traseira do carro, o que fez com que sua mãe olhasse para trás. Segundos após, viu na sua frente a luz de outro veículo. Após tal fato, perdeu a consciência, acordando muito depois no hospital.
DEPOIMENTO DO RÉU
O réu Adailton da Costa Souza, interrogado, declarou que na data dos fatos estava retornando do Country Club quando avistou o veículo das vítimas atravessado na pista. Tentou frear, mas não conseguiu, atingindo-o na traseira. Após a colisão ele estacionou o seu carro e esperou a chegada de socorro. Quando a ambulância chegou ao local ele foi para a casa da sua mãe. Até esse momento não havia ingerido bebidas alcoólicas. Apenas na casa de sua mãe ingeriu uma dose de Vodka.
O JUIZ DECIDIU
"As provas coligidas demonstram de forma patente a ocorrência dos delitos de homicídio culposo na direção de veículo automotor, assim como o de lesão corporal culposa de natureza grave, além da embriaguez ao volante e o delito de se afastar do local do acidente, para fugir à responsabilidade penal ou civil, tal como narrado na exordial acusatória, não merecendo acolhida a tese defensiva no sentido de ausência de culpa a ensejar a absolvição. A par disso, além da admissão do acusado de que se envolveu com o acidente descrito na denúncia, está o fato de que foi localizado o para-choque traseiro do Corsa conduzido pelas vítimas e na peça, com o impacto, ficou gravada a placa do veículo VW/Golf conduzido pelo réu na ocasião. Tal fato foi determinante para a localização e identificação do acusado. No mais, a versão apresentada pelo réu de que o veículo Corsa ocupado pelas vítimas estava atravessado na pista e que, acidentalmente, colidiu na traseira, encontra-se completamente isolada nos autos. A vítima sobrevivente foi assertiva tanto na Delegacia como em Juízo ao afirmar que estava no banco traseiro do veículo conduzido pelo pai, quando sentiu um forte impacto na traseira do carro, fazendo com que a mãe, que estava no banco do passageiro olhasse para trás. No mesmo sentido foram as declarações ofertadas pelos policiais que atenderam a ocorrência. Ambos afirmaram em Juízo que o VW/Golf colidiu na traseira de um GM/Corsa, projetando-o contra um caminhão que trafegava na contramão de direção. Em nenhum momento, a perícia concluiu que o carro no qual as vítimas trafegavam estivesse atravessado na pista ou parado...
Diante desse panorama, o contexto probatório demonstra que o réu deixou de guardar a devida atenção com o trânsito que seguia à frente e não observou as regras de cautela previstas no Código de Trânsito Brasileiro, colidindo, em função da velocidade maior imprimida, contra a traseira do carro que trafegava à frente. Não se admite, portanto, a tese defensiva de ausência de culpa do acusado no acidente de trânsito que vitimou duas pessoas, causando-lhes ferimentos determinantes para o óbito, além de deixar uma terceira gravemente ferida, com lesões que representaram perigo de vida ocasionado por traumatismo cranioencefálico. É notório que o réu agiu com imprudência e não observou os preceitos do art. 28 do CTB... Contudo, cumpre salientar que a Lei nº 13.546/17 acrescentou o § 3º, ao artigo 302, da Lei nº 9503/97, criando a modalidade qualificada do crime de homicídio culposo na direção de veículo automotor (vítimas Dilce e Paulo), se o agente pratica a conduta sob a influência de álcool, bem como o § 2º, ao artigo 303, criando a modalidade qualificada do delito de lesão corporal culposa, se o agente pratica a conduta sob a influência de álcool e do crime resultar lesão corporal de natureza grave (vítima Pamela). Ocorre que referida Lei passou a viger após os fatos aqui tratados, ou seja, 120 dias após a data de sua publicação, ocorrida em 20/12/2017, não se mostrando possível sua incidência ao presente caso, por ser mais prejudicial ao réu.
No mais, não prospera a tese defensiva de que não é possível imputar ao sentenciado o delito do artigo 305 do CTB (fuga do local do acidente) porque foi identificado logo após o acidente, sendo irrelevante sua ausência no local. Ora, não fosse a força do impacto imprimir a placa do veículo conduzido pelo réu na peça traseira do Corsa, não haveria outra forma de identificá-lo, pois apenas o funcionário da empresa “Entrevias” fez menção de que um veículo VW/Golf estava envolvido no acidente, sem apontar maiores detalhes. Outrossim, é evidente que o acusado deixou o local dos fatos para evitar sua responsabilização, vez que a afirmativa de que aguardou a chegada da equipe de socorro não tem amparo nas provas dos autos. O próprio laudo pericial descreve que o veículo VW/Golf fez manobra evasiva, adentrando inclusive em via lateral de terra, onde o para-choque do veículo Corsa foi deixado. Já o funcionário da empresa “Entrevias”, ouvido apenas em sede policial, disse que viu o veículo VW/Golf parado e, em seguida, saiu fazendo barulho como se estivesse arrastando algo, prosseguindo o percurso por alguns metros até parar e se desvencilhar de algum objeto. Nota-se que o pouco tempo que o acusado permaneceu no local foi apenas para se desvencilhar da peça que se fixou em seu veículo com a colisão, e sua trajetória, evidentemente, foi para afastar-se do local do acidente, fugindo de eventual responsabilidade.
Presente, ainda, a causa de aumento prevista no § 1º, inciso III, do artigo 302 da Lei nº 9.503/97, também em relação ao delito previsto no artigo 303, § 1º, do mesmo Código. Como já explanado, houve omissão de socorro, pois o acusado empreendeu manobra evasiva no veículo que conduzia e, o pouco tempo que ali permaneceu, não foi para aguardar a equipe de socorro, mas somente para se livrar da peça que se soltou do veículo Corsa e se prendeu em seu para-choque. Importante registrar que o réu sequer acionou funcionários da rodovia ou mesmo a Polícia, pois pelo apurado o serviço operacional da pista tomou conhecimento do acidente em função de ronda rotineira realizada no local...
Não bastasse, restou comprovado que o réu incorreu na conduta descrita no artigo 306 do CTB, eis que conduziu veículo automotor sob o efeito de álcool, fazendo presumir a alteração da capacidade psicomotora. Através dos detalhes da placa localizados no local do acidente, os policiais identificaram o antigo proprietário do veículo e chegaram até a residência do acusado, que apresentava sinais de embriaguez segundo eles. Como afirmado pelos policiais, o teste do etilômetro acusou quantidade de álcool superior à permitida por lei, reiterando-se que o sentenciado efetivamente conduziu veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão do consumo de bebida alcoólica, oferecendo dano potencial há pelo menos três vítimas na ocasião, duas delas fatais. Pondero que a atribuição do uso de álcool a uma dose de vodka ingerida quando já estava em sua residência não procede.
A alegação do acusado não possui respaldo probatório e, além disso, apresenta-se completamente dissociada daquela ofertada em sede policial, quando relatou que passou à tarde no “Country Club” e ingeriu três latinhas de cerveja, revelando que em Juízo inovou a versão no intuito de desvencilhar-se da acusação de embriaguez ao volante. Apesar da avaliação do estado do acusado ter ocorrido em torno de três horas após o evento, tal fato não é capaz de afastar a ebriedade no instante do acidente, ante a robusta prova coligida aos autos.
Comprovadas, assim, a materialidade e a autoria dos crimes de homicídio culposo na direção de veículo automotor e de se afastar do local do acidente para fugir a responsabilidade, ausente causa de exclusão da ilicitude do fato ou da culpabilidade do agente, inevitável a condenação...
Pelo exposto, julgo parcialmente procedente a acusação para condenar o réu pela prática dos crimes: (i) descrito no artigo 302, “caput”, §1º, inciso III, da Lei nº 9.503/1997 (por duas vezes), c/c artigo 70 do Código Penal, à pena de 3 (três) anos, 7 (sete) meses e 16 (dezesseis) dias de detenção e suspensão ou proibição de obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor pelo prazo de 3 (três) meses e 18 (dezoito) dias; (ii) descrito no artigo 303, “caput”, §1º c/c artigo 302, §1º, inciso III, todos da Lei nº 9.503/1997, à pena de 8 (oito) meses de detenção, além da suspensão ou proibição de obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor pelo prazo de 2 (dois) meses e 20 (vinte) dias; (iii) descrito no artigo 305 da Lei nº 9.503/1997, à pena 6 (meses) meses de detenção; (iv) descrito no artigo 306 da Lei nº 9.503/1997, à pena 6 (seis) meses de detenção e 10 (dez) dias-multa, além da suspensão ou proibição de obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor pelo prazo de 2 (dois) meses. Em virtude do concurso material de infrações penais (artigo 69 do Código Penal), as penas deverão ser somadas, totalizando 5 (cinco) anos, 3 (três) meses e 16 (dezesseis) dias de detenção e 10 (dez) dias-multa, além da suspensão ou proibição de obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor pelo prazo de 8 (oito) meses e 8 (oito) dias.
Tendo em vista o “quantum” da pena dimensionada e as graves circunstâncias referidas, mostra-se adequado o regime semiaberto para início do cumprimento da pena privativa de liberdade. Considerando as graves circunstâncias judiciais do crime, que vitimou pai e mãe da adolescente, além de deixá-la gravemente ferida e correndo risco de vista, ao ponto de permanecer hospitalizada por quase um mês, entendo inviável a substituição da pena corpórea por penas restritivas de direito, a teor do disposto no artigo 44, inciso III, do Código Penal.
Inaplicável, ainda, a suspensão condicional da pena (artigo 77 do Código Penal). Concedo ao réu o direito de apelar em liberdade, ante a ausência de elementos concretos a embasar a necessidade de prisão preventiva, especialmente porque permaneceu solto durante toda a instrução...".



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