O juiz da Vara da Fazenda Pública do Fórum de Marília, Walmir Idalêncio dos Santos Cruz, emitiu , mais 24 sentenças determinando que proprietários de apartamentos do desalojado Conjunto Habitacional Paulo Lúcio Nogueira, os chamados predinhos da CDHU, na zona sul de Marília, deverão receber indenizações de R$ 30 mil cada um por danos morais.
O pagamento para cada proprietário deverá ser feito da seguinte forma: R$ 15 mil pela Prefeitura de Marília e R$ 15 mil pela Companhia de Desenvolvimento Urbano de Habitacional (CDHU), órgão do Estado.
Neste mês, já são 39 sentenças nesse sentido. Uma das sentenças emitidas foi sobre a ação por danos morais movida por uma proprietária apenas contra a CDHU, por deterioração do apartamento.
PAGAMENTOS DE INDENIZAÇÕES PODEM CHEGAR A MAIS
DE R$ 26 MILHÕES
Nas próprias sentenças (com o mesmo teor - veja abaixo) o próprio magistrado cita que as ações por danos morais de proprietários de apartamentos no desalojado CDHU podem chegar a centenas.
O conjunto possui 880 apartamentos. Ou seja, se todos moverem ações análogas, serão 880 ações. Ao custo de R$ 30 mil para cada autor por danos morais, as ações podem resultar em condenações de R$ 26 milhões e R$ 400 mil contra a Prefeitura de Marília e a CDHU, sendo R$ 13,2 milhões para cada instituição.
ALUGUEL SOCIAL
A Prefeitura já pagou auxílio mudança de R$ 600 para cada morador desalojado e vem pagando R$ 600 mensais a título de aluguel social para ex-moradores dos predinhos que comprovaram essa necessidade.
Esse auxílio, por tempo indeterminado, atendeu decisão do Tribunal de Justiça do Estado, em dezembro do ano passado, para "a imediata desocupação dos imóveis, bem como fornecimento de assistência técnica pública e gratuita para o projeto de construção e reformas de habitação de interesse social, além da realocação temporária de moradores para local seguro até a realização de obras urgentes, devendo o Município arcar com todos os custos de remoção e moradia dos moradores durante o período que se fizer necessário".
DESALOJADOS EM JULHO PASSADO
Os ex-moradores dos predinhos ingressaram com ações após serem desalojadas pela Prefeitura em julho passado, junto com todos os ocupantes dos 880 apartamentos do local, interditado pela Justiça sob riscos de desabamento.
SUSPENSÃO DOS PAGAMENTOS DE PRESTAÇÕES
Na mesma sentença, há determinação para que a CDHU fique impedida de cobrar prestações referentes aos financiamentos dos imóveis das autoras das ações, sob pena de multa diária de R$ 1 mil em caso de desobediência.
"A companhia (CDHU) insiste na cobrança das prestações de financiamento imobiliário. Diante de tal triste e trágico cenário, como também já adiantado na decisão, mostra-se desproporcional exigir da parte autora a continuidade do pagamento das parcelas do contrato, já que a posse útil do bem imóvel não é viável, tendo em vista a existência de vícios no imóvel. Portanto, a solução justa cabível na espécie não pode ser outra que não a suspensão da exigibilidade das parcelas de financiamento discriminadas no contrato, até que o imóvel descrito na inicial, comprovadamente, reúna condições de habitabilidade e que a parte autora da ação nele possa, efetivamente, residir. Por corolário lógico, deverá a CDHU se abster de praticar atos de cobrança, incluindo-se eventual negativação junto aos órgão de restrição de crédito".
"ABSURDA OMISSÃO" DA PREFEITURA E DA CDHU
Na sentença, o juiz justificou a condenação de pagamentos de danos morais às ex-moradoras dos predinhos.
"No que diz respeito à pretensão indenizatória por danos morais, assiste total razão à parte autora da ação. Com efeito, é inegável que os requeridos descumpriram solenemente o prazo fixado pelo E. TJSP para cumprimento da determinação judicial para desocupação do Conjunto Habitacional Paulo Lúcio Nogueira. Assim agindo, os requeridos, mantendo-se inertes, contribuíram decisivamente para, desprestigiando a autoridade da r. Decisão, expor a risco intolerável os moradores do aludido conjunto habitacional, aqui incluída à parte autora, que nele reside, consoante os documentos comprobatórios trazidos com a inicial".
E seguiu o despacho judicial:
"Veja-se que a omissão dos demandados motivou a própria Desembargadora Relatora dos Agravo de Instrumento pertinente a determinar a cientificação pessoal do Excelentíssimo Senhor Prefeito do Município de Marília, como também do Presidente da CDHU, para que adotassem as providências necessárias para o efetivo cumprimento da ordem emanada do E. TJSP. Veja-se que, mesmo extrapolado, há muito, o prazo concedido pela Corte de Justiça Bandeirante, o conjunto habitacional continuou habitado por meses a fio, ensejando o risco de verdadeira tragédia, com a desnecessária perda de vidas em razão do provável colapso das estruturas residenciais, o que consta de diversos laudos periciais trazidos aos autos da Ação Civil Pública, o que, frise-se, era de inteira ciência dos requeridos (Município de Marília e CDHU), que figuram como partes naquele feito. Também é oportuno registrar que o prazo fixado pela Eminente Desembargadora Mônica Serrano transcorreu in albis sem que os requeridos apresentassem, ao menos, um cronograma para desocupação do conjunto habitacional, o que só foi juntado aos autos da Ação Civil Pública após a expiração do prazo e a prolação de decisão de Primeiro Grau naquele feito, em que este Juízo deixou expressamente consignada a caracterização do descumprimento da r. Decisão emanada da Corte de Justiça Bandeirante. Necessário trazer à baila tais fatos para que se tenha uma noção mais apropriada não apenas do grau, como também da potencialidade lesiva da absurda omissão dos requeridos no que tange ao cumprimento tempestivo do comando judicial exarado pelo E. TJSP . Não se pode olvidar que centenas de pessoas continuaram a residir no CDHU, sendo expostas a perigo real e iminente de desabamento das unidades residenciais, mesmo após a expiração do prazo determinado pelo Poder Judiciário do Estado de São Paulo e mesmo após a dilação de prazo concedida em Segundo Grau de Jurisdição. A situação de precariedade de todo o conjunto habitacional, destaque-se, perdura há anos, como bem salientado pela Eminente Desembargadora prolatora da r. Decisão, e era de pleno conhecimento dos requeridos, que, decididamente, não podem dizer que foram "pegos de surpresa" com a determinação judicial. A parte autora da ação, portanto, foi exposta a inaceitável e contínuo perigo a sua vida e integridade física, já que, sendo hipossuficiente, não tem sequer para onde ir sob as próprias expensas. Contribuem de forma determinante para tal inaceitável quadro a omissão e inércia dos requeridos, que, bem por isso, devem ser responsabilizados, nesta demanda, pelos danos morais sofridos pela parte autora. Danos morais que, de resto, ficaram amplamente demonstrados nos autos e decorrem da perda da paz e da inimaginável perturbação emocional e psíquica que acomete todo aquele que sabe que pode morrer ou testemunhar a morte de seus entes queridos a qualquer momento, em razão do desabamento de imóvel residencial, sem ter para onde ir e sem saber ao menos quando e de que forma, exatamente, os requeridos promoverão a realocação das famílias residentes do Conjunto Habitacional Paulo Lúcio Nogueira, de acordo com determinação judicial. Importante, nesse sentido, rememorar que o cronograma pertinente foi apresentado intempestivamente, somente após o prazo concedido pelo E. TJSP para a efetiva desocupação das unidades residenciais. Lamenta-se, finalmente, que os efeitos financeiros decorrentes da indenização atrelada ao ilícito perpetrado pelos entes demandados tenham de ser suportados pelo erário público de Marília e do Estado de São Paulo, para o qual contribuem todos os cidadãos paulistas e marilienses, que em nada concorreram, pessoalmente, para a omissão e o descumprimento de determinação judicial aqui considerados".
AÇÕES DISTINTAS
O departamento jurídico da CDHU solicitou que as ações com pedidos de indenizações por danos morais, ajuizadas por proprietários de apartamentos no referido conjunto, fossem "juntadas" à uma Ação Civil Pública que tramita desde 2018 pela mesma Vara.
O magistrado negou o pedido, justificando que "a Ação Civil Pública referida pela CDHU em contestação tramita de acordo com rito diverso. Diante de tal contexto, reunir as centenas de possíveis ações individuais para julgamento conjunto com a Ação Civil Pública provocaria inegável retardamento da entrega da prestação jurisdicional e violação da garantia prevista no artigo 5º, inciso LXXVIII, que dispõe acerca do prazo razoável para a tramitação processual. Afinal, não nos parece razoável aguardar a tramitação de centenas de ações até o momento de prolação de sentença, sem qualquer decisão de mérito, sobretudo se considerarmos que as demandas encontram-se em fases processuais distintas e muitas não foram sequer propostas ainda".
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