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Por Adilson de Lucca

Justiça nega pedido de anulação da concessão do Daem e manda Prefeitura refazer edital


O juiz da Vara da Fazenda Pública do Fórum de Marília, Walmir Idalêncio dos Santos Cruz, julgou parcialmente uma Ação Civil Pública ajuizada pela OSCIP Matra (Marília Transparente) e em sentença publicada nesta quarta-feira (30), ratificou decisão "para invalidar os atos praticados no bojo da concorrência nº 013/2022, objetivando a concessão dos serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário das áreas urbanas de Marília (conforme edital), incluindo-se a sessão para abertura de envelopes aludida na sobredita decisão, mas autorizando expressamente o Município de Marília a retificar o edital, nos termos em que deliberado pelo TCE/SP, o que poderá ocorrer desde logo, possibilitando-se ao ente público requerido a republicação do ato convocatório devidamente corrigido (novo edital), sanando as irregularidades apontadas pela Corte de Contas, e, também, as desconformidades à legislação de regência, já consideradas na decisão (aqui incluídas regras editalícias claras e expressas acerca da modicidade de tarifas, metas de universalização do atendimento e implantação de tarifa social), observando-se a integralidade dos prazos legais e o interregno necessário à plena formulação das propostas".

O magistrado negou pedido da Matra para "a desconstituição do procedimento licitatório, desde sua deflagração, incluindo-se a sessão para abertura de envelopes das propostas".

Justificou que "o mérito (conveniência político-administrativa) da concessão em debate já foi decidido pelo povo de Marília, que, através Lei Complementar Municipal nº 938/2022, aprovada junto à Câmara Municipal, autorizou a referida concessão da exploração econômica dos serviços públicos ora prestados pelo DAEM".

A AÇÃO

A Oscip (Organização de Sociedade Civil de Interesse Público) Matra (Marília Transparente) entrou com uma representação na Justiça alegando falta de transparência da Prefeitura no processo de licitação do Daem (Departamento de Água e Esgoto de Marília) à iniciativa privada.

De acordo com o documento encaminhado pela Matra à Vara da Fazenda Pública, “beira a má fé” o fato da Administração Pública Municipal não responder imputações de irregularidades na referida concorrência. A sentença foi despachada ontem e publicada nesta quarta-feira (30).

A Matra foi responsável por uma ação popular que culminou em liminar para a suspensão do edital de licitação da concessão do Daem. Após contestação da Prefeitura à petição da Matra, a entidade respondeu: “A contestação do Município de Marília não impugna especificamente grande parte dos argumentos expostos na petição inicial… O Município diz, de maneira genérica, que os estudos preliminares e de viabilidade estão presentes em anexos de edital – sem indicar, contudo, citando exatamente e como tais anexos preenchem os requisitos legais da Nova Lei de Licitações”.

A Matra destacou ainda que “a Prefeitura mente ao dizer que não há cláusula arbitral” e que apresenta de forma genérica informações “sem individualizar minimamente”. “E quando os argumentos da petição inicial são de fato impugnados, a versão adotada pelo Município beira a má- -fé”, enfatiza o documento da Oscip Matra.

Entre outros pontos, o edital não estaria trazendo, conforme a Matra, dados específicos sobre a saúde financeira do Daem.

Além disso, existem irregularidades no trâmite licitatório. Há a ausência de um Plano Diretor de Saneamento, bem como de especificação de metas de expansão, de receitas alternativas à receita tarifária e de metodologia de cálculo de eventual indenização de investimentos não amortizados.

VEJA A ÍNTEGRA DA DECISÃO PUBLICADA NESTA QUARTA-FEIRA (30)

Ação Civil Pública

Assunto: Água e/ou Esgoto

Magistrado: WALMIR IDALENCIO DOS SANTOS CRUZ

Comarca: Marília - Vara da Fazenda Pública

Data de Disponibilização: 30/08/2023

"Trata-se de ação civil pública ajuizada pela OSCIP MATRA - MARÍLIA TRANSPARENTE contra o MUNICÍPIO DE MARÍLIA. Verte da inicial , em síntese, que o Município de Marília deflagrou procedimento licitatório por meio da concorrência nº 13/2022, objetivando a concessão dos serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário nas áreas urbanizadas de Marília/SP, pelo prazo de 35 (trinta e cinco) anos.

A parte autora da ação aponta uma série de irregularidades existentes no edital do certame, bem como o não atendimento de disposições previstas no Marco Legal do Saneamento Básico (Lei Federal nº 14.026/2020), na Lei Federal nº 11.445/2007, e na Lei Federal nº 14.1333/2021, dentre outras.

Daí porque postulou a desconstituição do procedimento licitatório, desde sua deflagração, incluindo-se a sessão para abertura de envelopes das propostas, então designada para o dia 21 de março de 2023, às 09h00min. Acompanharam a inicial os documentos. Em obediência ao artigo 2º, "caput", da Lei Federal nº 8.437/1992, determinou-se a notificação prévia da Municipalidade e a intimação do DAEM - DEPARTAMENTO DE ÁGUA E ESGOTO DE MARÍLIA. Manifestação do DAEM, por força da qual a autarquia municipal externou seu desinteresse em intervir no presente feito. Manifestação prévia do Município de Marília. Seguiu-se a petição, pela OSCIP autora da ação. Manifestações do Ministério Público. A liminar foi concedida. Réplica, com o documento. Nova manifestação do Ministério Público. Seguiu-se, ainda, nova manifestação do Município de Marília, tendo sido comunicado ao juízo acerca do desfecho da análise procedida pelo TCE/SP, objetivando o procedimento licitatório em exame, com os documentos. Derradeiras manifestações das partes.

É o relatório do quanto basta. FUNDAMENTO E DECIDO. Desnecessária a dilação probatória em audiência, o feito comporta julgamento de plano, nos moldes do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil.

Como já adiantado na decisão, é certo que o Poder Executivo detém a discricionariedade no que pertine à concessão dos serviços de fornecimento de água e disponibilização de esgoto prestados pelo DAEM – Departamento de Água e Esgoto de Marília, como afirmado pelo ente público em sua manifestação. Ao Poder Judiciário, por outro lado, cabe o exame de legalidade dos atos administrativos, ex vi da Súmula nº 473 do C. STF.

No caso em exame, o procedimento licitatório e o edital que o deflagrou carecem de esclarecimentos imprescindíveis ao seu regular andamento, fato que, inclusive, não passou desapercebido ao Tribunal de Contas do Estado de São Paulo – TCE/SP. Veja-se, nesse sentido, que o TCE/SP determinou a suspensão da concorrência objetivando a concessão do DAEM à iniciativa privada. Como acertadamente observado pela OSCIP MATRA em sua inicial, a) houve opacidade de dados, envolvendo balancetes e a declaração de bens do DAEM durante período considerável da vigência do edital da Concorrência nº 13/2022, desde, ao menos, o dia 16 de dezembro de 2022, o que revela a quebra da necessária isonomia entre eventuais licitantes; b) não houve a realização de estudo técnico preliminar, como previsto no artigo 6º, inciso XX, e no artigo 18, inciso I, e §1º, da Lei nº 14.133/2021 e no artigo 11 da Lei nº 11.145/2007; c) a receita da futura AMAE – Agência Municipal de Água e Esgoto corresponderia a 0,5% do faturamento da concessionária fiscalizada (artigo 32, item 11, da Lei Complementar nº 938/2022), o que, em tese, subverteria o princípio da impessoalidade (o ente público fiscalizador estaria sendo remunerado diretamente pela empresa privada fiscalizada), em detrimento da coletividade de usuários do serviço de água e esgoto; d) há aparente omissão na maneira pela qual ocorreria a remuneração de eventual tribunal arbitral, como corretamente sustentado pela MATRA em sua inicial; e) há aparente ausência de cláusulas essenciais, previstas no art. 10-A, da Lei nº 11.145/2007, bem como do anteprojeto de que trata o artigo 46, §2º, da Lei nº 14.133/2021; f) o item 29.4 do edital prevê poder de aprovação de loteamentos (convencionais ou de interesse social) à concessionária de serviço público, o que se mostra incompatível com o artigo 30, incisos I e VIII, da CF/88.

O quanto sustentado pela MATRA encontra arrimo na extensa documentação. Há, como se vê, diversas inconsistências no edital do certame, na lei local de regência e no procedimento adotado, a serem harmonizadas com a Constituição Federal e com as disposições aplicáveis das Leis Federais nºs 11.145/2007 e 14.133/2021.

Ilegalidades e inconstitucionalidades, que, por sua vez, podem e devem ser corrigidas pelo Poder Judiciário, no exercício de sua função própria, à luz da Súmula nº 473 do C. STF, sem que se possa cogitar de violação à cláusula de separação de poderes. A análise judicial, no caso sub judice, nem de longe se liga ao exame do mérito ou da discricionariedade dos atos de gestão próprios do Poder Executivo.

Note-se que as inconsistências discutidas já motivaram a suspensão do certame perante o TCE/SP. Necessário que o Poder Judiciário também se pronuncie acerca do tema, dada a independência de instâncias e a possibilidade de que a decisão administrativa do TCE/SP seja reconsiderada no porvir, com o que, a nosso sentir, não ocorreu a perda de objeto referida pelo Ilustre Representante do Ministério Público subscritor da manifestação. Ademais, observo que as irregularidades aqui observadas também foram objeto de recente análise final pelo TCE/SP em autos próprios (TC-006240-989.23-6;TC-006281.989.23-6; TC-006686.989.23-7; TC-006886.989.23-5; e TC-006890.989.23-9), tendo sido detectadas diversas desconformidades, com deliberação concernente à retificação do edital da concorrência pública, devidamente corrigido.

É o caso, portanto, de se determinar a procedência parcial do pedido formulado nesta ação civil pública, com determinação para que sejam encetadas, pela Municipalidade, providências no sentido de serem plenamente sanadas as irregularidades e atendidas as exigências vertidas na v. Deliberação do TCE-SP e, também, na decisão, de modo a invalidar a concorrência pública referida na inicial, mas viabilizando-se ao ente público requerido a retificação do edital, de modo a adequa-lo às exigências legais vertidas na normatividade de regência. Assim porque, veja-se bem, o mérito (conveniência político-administrativa) da concessão em debate já foi decidido pelo povo de Marília, que, através Lei Complementar Municipal nº 938/2022, aprovada junto à Câmara Municipal, autorizou a referida concessão da exploração econômica dos serviços públicos ora prestados pelo DAEM.

Fixadas tais premissas, não cabe ao Poder Judiciário decidir pela inviabilidade da concessão disputada, que deve prosseguir (com as ressalvas aqui contidas), ex vi da Lei Complementar Municipal nº 938/2022, aprovada pelos Nobres Edis marilienses e sancionada pelo Chefe do Poder Executivo local.

Isto posto, na forma do que dispõe o artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO, apenas e tão somente para o fim de, ratificando a decisão de fls. 321/323, invalidar os atos praticados no bojo da concorrência nº 013/2022, objetivando a concessão dos serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário das áreas urbanas de Marília (conforme edital de fls. 101 e seguintes), incluindo-se a sessão para abertura de envelopes aludida na sobredita decisão, mas autorizando expressamente o Município de Marília a retificar o edital, nos termos em que deliberado pelo TCE/SP às fls. 405/448 (TC-006240-989.23-6;TC-006281.989.23-6; TC-006686.989.23-7; TC-006886.989.23-5; e TC-006890.989.23-9), o que poderá ocorrer desde logo, possibilitando-se ao ente público requerido a republicação do ato convocatório devidamente corrigido (novo edital), sanando as irregularidades apontadas pela Corte de Contas, e, também, as desconformidades à legislação de regência, já consideradas na decisão de fls. 321/323 (aqui incluídas regras editalícias claras e expressas acerca da modicidade de tarifas, metas de universalização do atendimento e implantação de tarifa social, como acenado às fls. 466), observando-se a integralidade dos prazos legais e o interregno necessário à plena formulação das propostas. Tendo em vista a natureza da ação e a ausência de evidências de má fé, não há que se falar em condenação da OSCIP autora em honorários advocatícios (artigo 18 da LACP – Lei Federal nº 7.347/85), mas, tendo em vista a sucumbência recíproca (artigo 85, §14, do CPC), arcará o Município de Marília com o pagamento de verba honorária que ora fixo por equidade, na forma do artigo 85, §2º, do CPC, em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), tendo em vista o valor bilionário dado à causa, com aplicação da taxa SELIC (artigo 3º da EC nº 113/2021) a partir da presente data. Acerca da fixação de verba honorária por equidade em casos que tais, já decidiu o E. TJSP, in verbis: "Ação rescisória. São Paulo. Honorários advocatícios corretamente fixados mediante apreciação equitativa. Hipótese em que a aplicação do art. 85, §3º, do CPC, resultaria em valor irrazoável e desproporcional ao trabalho desenvolvido e à complexidade da causa. Precedentes. Entendimento sufragado por recente decisão do Supremo Tribunal Federal. Não incidência, ademais, do Tema 1076 do STJ. Restituição dos autos à vista do art. 1.040, II, do CPC para eventual adequação. Acórdão mantido" (TJSP; Ação Rescisória 2221267-83.2018.8.26.0000; Relator (a): Antonio Celso Aguilar Cortez; Órgão Julgador: 5º Grupo de Direito Público; Foro de Jaú - 4ª Vara Cível; Data do Julgamento: 08/08/2023; Data de Registro: 10/08/2023) Ciência ao Ministério Público. Oportunamente, providencie-se a remessa necessária, com as homenagens deste Juízo. P.R.I.C. Marilia, 29 de agosto de 2023 Walmir Idalêncio dos Santos Cruz JUIZ DE DIREITO".

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