J. POVO- MARÍLIA
Morador de condomínio de luxo é condenado a pagar indenização por ofender porteiro: "lixo", "mula"

Morador do luxuoso condomínio residencial Terras da Fazenda, na Zona Leste de Marília, foi condenado a pagar R$ 8 mil a título de danos morais a um porteiro do local ofendido verbalmente diversas vezes por ele. A decisão é da juíza Thaís Feguri Krizanowski Farinelli, da Vara do Juizado Especial Cível do Fórum de Marília e cabe recurso. O acusado é servidor da Justiça Eleitoral.
A magistrada mencionou nos autos "que o porteiro apresentou diversos vídeos e propôs ação de indenização por danos morais alegando ter sofrido abalo à sua esfera pessoal, ao argumento de que foi humilhado, intimidado e ridicularizado pelo réu, Mário Jorge Rodrigues Daflon, em seu local de trabalho e na presença de outras pessoas, em pelo menos duas ocasiões, tendo este praticado xingamentos e agido de forma desrespeitosa e arrogante com a sua pessoa. O réu é proprietário de imóvel situado no condomínio residencial “Terras da Fazenda”, situado nesta cidade, local onde a empresa “SPSP”, presta o serviço de portaria.
No caso dos autos, no que tange as humilhações e ao tratamento desrespeitoso que o requerente sustenta ter sofrido pela pessoa do requerido na data de 02 de outubro de 2020, nas dependências da portaria daquele mencionado condomínio residencial, logrou êxito aquele em demonstrar esta ocorrência.
Isto porque, conforme as mídias indicadas, comprovou a parte requerente que de fato sofreu xingamentos e tratamento grosseiro por parte do requerido, a justificar a condenação deste o pagamento da indenização por danos extrapatrimoniais.
Por meio das mencionadas imagens é possível observar que o morador realmente compareceu junto a portaria do condomínio, e, quando da chegada do porteiro ao local (vide vídeos), passou a trata-lo com agressividade e de forma arrogante e desrespeitosa, pois, além de tentar intimida-lo com palavras de ordem, ainda proferiu palavras humilhantes e depreciativas contra a pessoa daquele, indagando de forma grosseira quem seria o demandante e afirmando que ele era “folgado”, “lixo”, “moleque” e “mula”.
Seguem os autos citando que "não se olvida, ainda, que o requerido em grande parte do diálogo usou elevado tom de voz, chegando a alguns momentos a gritar com o requerente, tudo isso na presença de outros funcionários, fato que vem a fortalecer a tese de comportamento indigno praticado contra aquele, sobretudo porque, além deste tratamento, o réu em alguns momentos ainda foi na direção do porteiro com nítida intenção agressiva e intimidatória, chegando a empurrá-lo de forma hostil em vários momentos (vide vídeos).
O porteiro, por sua vez, ao contrário do alegado pelo réu, em um primeiro momento, tentou apenas explicar a situação ocorrida, a qual se desdobrou, segundo consta da petição inicial e sequer negado pelo réu em momento processual oportuno, dos problemas enfrentados pela esposa do requerido quando do ingresso no condomínio, ocorridos em dia anterior ao entrevero na portaria do condomínio particular, informando que o procedimento dele era compatível com as ordens à ele passadas e que, por esta razão, seriam cumpridas.
Importante dizer, aliás, que o acirramento dos ânimos entre as partes, o qual notadamente se observa no vídeo, com discussão entre as partes em alto tom de voz, se deu, preponderantemente, pelo tratamento desrespeitoso e descortês empregado pelo réu desde o momento em que o autor chegou na portaria, o que, certamente, exaltou os ânimos deste, xingado, ofendido e desrespeitado em seu ambiente de trabalho.
Nota-se, ainda, por meio do indicado vídeo, que o porteiro não inicia nenhuma agressão verbal contra o morador, somente respondendo as agressões verbais proferidas pelo ofensor, as quais, diga-se, ocorreram por reiteradas vezes.
No caso, as imagens demonstram todo o estado emocional do réu, estando este, quando da ocorrência dos fatos, nitidamente alterado e irritado, sendo este o fator relevante para a ocorrência do atrito havido nas dependências da portaria condominial.
Tem-se, ainda, que o porteiro após a acalorada discussão tenta por fim ao entrevero, abaixando o tom de voz e reiterando suas explicações na nítida intenção de apaziguar a situação, sendo, todavia, em vão tal tentativa, pois, mesmo com a atitude praticada pelo demandante, o morador continuou com o tratamento indigno contra o funcionário do condomínio, gritando contra ele e o chamando de “moleque”, o que fica claro no momento do vídeo, iniciando-se nova discussão.
Além disso, conforme se observa do vídeo, o requerido, mesmo na ausência do autor no local dos fatos, já demonstrava comportamento inadequado, uma vez que de forma deselegante e arrogante conversa com outros funcionários presentes na portaria do condomínio, chegando a mencionar, quando solicitado a procurar o autor, que seria associado do local e que seria “muito mais que ele” (referindo-se ao porteiro), vide mídia correspondente.
Aliás, ainda que o morador demonstrasse a alegação lançada na petição defensiva para o justificar o tratamento empregado contra os funcionários do condomínio, qual seja, de que vem sofrendo tratamento diferenciado em relação a outros moradores do local, fato este que os elementos probatórios contidos nos autos sequer apontam, tal circunstância, por si só, não afastaria a responsabilidade do réu em indenizar o autor pelo tratamento indigno contra ele empregado, pois, uma vez existindo o alegado infortúnio descrito em defesa, caberia ao réu procurar a devida solução perante a administração do condomínio e não tratar de forma descortês e grosseira os trabalhadores do local, no qual se inclui o requerente.
Convém pontuar que não existe nenhum elemento probatório nestes autos que o porteiro, ou qualquer funcionário sob a sua supervisão, tenha tratado a esposa do requerido de forma desrespeitosa, tampouco que o tratamento a ela empregado quando da ocorrência do fato narrado na petição foi vexatório ou extrapolou as raias do bom senso.
Ou seja, não há qualquer indicativo de que a parte autora tenha se excedido no cumprimento do seu dever contra o réu ou sua esposa. Se não bastasse todo o entrevero ocorrido no dia 03 de outubro de 2020, nota-se dos autos que o morador, objetivando, entre outros pleitos, ser indenizado por danos morais, ajuizou ação contra a associação do condomínio “Terras da Fazenda” e a empresa empregadora do autor, ao argumento de indigno tratamento e injusta ofensa praticada por funcionários do local no dia 07 de março de 2020, a qual, todavia, foi julgada improcedente, tendo o juízo sentenciante, inclusive, indicado que o comportamento ofensivo partiu do demandante daquele processo, ora requerido, destacando no decisum que: “A mídia trazida pelo autor, em verdade, produziu prova contra ele próprio. A mídia revelou todo estado anímico e emocional do autor, por ocasião dos fatos, estando ele totalmente alterado, nervoso e por conta disso ocorreram os fatos narrados na exordial. (...). Não se extrai da filmagem e respectivo áudio qualquer ofensa ou menosprezo á pessoa do autor. Em verdade, foi o autor quem teve uma atitude desproporcional e arrogante diante da negativa da porteira e do ronda de lhe entregarem os 20 pratos de sobremesa e respectivos talheres. O autor da demanda, ao que parece, por ter formação jurídica e trabalhar junto ao TRE, diante de seu estado anímico na ocasião, adotou postura enérgica e totalmente despropositada diante dos funcionários da SPSP, os quais, por certo, não possuem formação jurídica e não teriam argumentos para convencer o autor de que existiria uma recomendação, ainda que verbal da chefia da prestadora de serviços SPSP, para agirem da forma como estavam agindo.
Por isso é que o autor acabou adentrando na Portaria sem autorização da porteira ou do ronda que lá estava, e a tudo presenciou. Em verdade, foi o autor quem agiu de forma desconforme ao direito ao adentrar no recinto da portaria sem autorização dos funcionários que ali estavam. Condôminos devem seguir as regras do condomínio. As regras são criadas para haver uma harmonia entre todos os condôminos. Se o autor não concorda com as regras estipuladas pelo próprio condomínio ou eventualmente pela prestadora de serviço contratada, no caso, SPSP, que formule suas reclamações por escrito, a quem de direito, para que a matéria seja submetida a uma assembleia ordinária ou extraordinária para que todos os demais condôminos possam decidir acerca daquela questão. Obviamente que a funcionária e funcionário não teriam como convencer o autor, naquela situação, diante do seu estado de prepotência e arrogância. Com a chegada do gerente ou administrador do condomínio, ficou ainda mais evidente esta arrogância. O autor sequer permitiu que ele explicasse aquela regra.(...)”.
Ou seja, por meio desta anterior sentença, a qual, importante dizer, além de ter sido julgada improcedente, já alcançou o respectivo trânsito em julgado , extrai-se que o comportamento deselegante e grosseiro do réu para com o autor não se resumiu aos fatos ocorridos no dia 03 de outubro de 2020, conforme comprovam as mídias, mas também já ocorrera em ocasião anterior, conforme observados nos autos daquele supracitado processo, o qual, em decisão final, ficou expressamente descrito o tratamento arrogante e prepotente do réu para com os funcionários do local, o que incluía a pessoa do demandante.
Neste passo, nos termos do art. 186 do Código Civil, diante das condutas perpetradas pelo requerido, conforme acima delineado, a ação deve ser julgada procedente para condená-lo na reparação devida, na medida em que o acervo probatório coligido nos autos não deixa dúvidas acerca do tratamento hostil e desrespeitoso praticado por ele contra o requerente, circunstância que se deu por meio de ofensas verbais e ações de nítido caráter intimidatório e com a intenção de constranger e menosprezar, tudo isso na presença de outras pessoas e no local de trabalho do ofendido.
Em outras palavras, evidente a ofensa à honra da parte autora em razão do tratamento indigno recebido, os quais, além de causar abalo a sua esfera íntima, o constrangeu perante terceiros, situação que inquestionavelmente causou danos de ordem moral, e, consequentemente, justifica para o requerido o dever de indenizar.
Imperioso dizer, também, que configurado não apenas o abalo moral, mas ainda o nexo de causalidade com a conduta da parte requerida, conforme acima já descrito, conclui-se pela pertinência do dever de reparar, passando-se a ser quantificado o montante indenizatório.
Anote-se, por sua vez, que a finalidade da reparação do dano moral é oferecer compensação ao ofendido atenuando seu sofrimento e, quanto ao causador do dano, tem caráter sancionatório para que não pratique mais ato lesivo a personalidade das pessoas.
Nesse ponto, deve-se considerar a capacidade financeira de ambas as partes, a gravidade do fato e a extensão do dano, visando conferir uma compensação à vítima, sem se perder o caráter punitivo-pedagógico, de modo a coibir a reincidência dos causadores do dano, evitando-se, contudo, que a indenização sirva de fonte de enriquecimento.
De tal modo, observado o critério de proporcionalidade e razoabilidade, bem como com base no acima exposto, verifica-se adequado fixar a indenização extrapatrimonial no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), porquanto proporcional ao abalo sofrido e condizente com as diretivas supracitadas.
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE, com resolução de mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, a presente ação ajuizada por C.A.M.A contra MÁRIO JORGE RODRIGUES DAFLON, para o fim de CONDENAR a parte ré a pagar ao autor a importância de R$ 8.000,00 (oito mil reais), a título de danos morais, com correção monetária tabela prática do Tribunal de Justiça de São Paulo e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, ambos contados a partir desta sentença (Súmula 362, do STJ). Sem custas e honorários advocatícios, na forma do artigo 55 da Lei 9099/95. Valor total das custas do preparo R$ 465,45 (quatrocentos e sessenta e cinco reais e quarenta e cinco centavos). P.I. Marilia, 09 de agosto de 2021. DOCUMENTO ASSINADO DIGITALMENTE".

