A Empresa de ônibus Grande Marília foi condenada a pagar R$ 20 mil de indenização por danos morais, além de R$ 180 por danos materiais, à uma passageira idosa que sofreu queda brusca no interior de um dos coletivo da empresa, após o mesmo passar em uma "valeta".
Testemunhas relataram que a idosa, com o solavanco, foi arremessada do banco, quase bateu no teto e caiu no piso do ônibus sofrendo danos na coluna.
A decisão é do juiz Gilberto Ferreira da Rocha, do Juizado Especial Cível.
O CASO
Conforme os autos, a passageira M.G.F, ajuizou a presente Ação de Indenização por Danos Morais alegando, em síntese, que em 12 de abril de 2024, por volta das 18h, sofreu grave queda no interior do ônibus.
Afirmou que o motorista conduzia o veículo em alta velocidade e, ao passar por uma "valeta" na via, provocou um solavanco que a arremessou do assento, fazendo-a chocar-se violentamente contra o piso do veículo.
Afirmou que, em decorrência direta do impacto, sofreu "fratura da coluna". Relatou ainda omissão de socorro imediato pelo condutor, que só teria parado o veículo após a insistência de outros passageiros.
Diante dos fatos, requereu a a condenação da empresa ao pagamento de indenização por danos morais no importe de R$ 30.000,00, além de danos materiais (despesas com medicamentos) no valor de R$ 306,00.
DEFESA
Citada, a empresa apresentou contestação, na qual negou a dinâmica narrada, aduzindo que as câmeras internas do veículo não registraram o evento e imputou culpa exclusiva à vítima, por suposta distração ou desequilíbrio. Alegou ainda que a passageira já possuia histórico de fratura anterior e osteoporose. Impugnou os danos materiais, apontando que parte dos recibos era anterior ao fato, e reputou excessivo o valor pleiteado a título de danos morais. Foi realizado Laudo Pericial Médico.
O JUIZ DECIDIU
"Trata-se de relação de consumo, figurando a autora como consumidora (passageira) e a ré como fornecedora de serviço de transporte (Art. 14, CDC).
Ademais, sendo a ré uma concessionária de serviço público, sua responsabilidade é objetiva, nos termos do Art. 37, §6º, da Constituição Federal, e do Art. 734 do Código Civil. Incide, na espécie, a cláusula de incolumidade, um dever implícito ao contrato de transporte, pelo qual o transportador assume a obrigação de resultado de levar o passageiro são e salvo ao seu destino. A responsabilidade objetiva somente é afastada se comprovada uma das excludentes do nexo causal: culpa exclusiva da vítima, caso fortuito ou força maior.
A empresa sustentou em sua defesa que "não se detectou qualquer tipo de evento" e que a autora teria se desequilibrado por distração. Contudo, a prova oral colhida em audiência é diametralmente oposta.
A testemunha E.O.P.M, ouvida sob compromisso legal, narrou com clareza e firmeza os fatos presenciados, tendo declaro que o motorista estava correndo na ocasião, quando passou por um buraco que lançou a passageira do banco. Ela, então, quase bateu no teto do coletivo e caiu de volta no banco, passando a gritar de dor, sendo que a testemunha e outra passageira socorreram a autora e chamaram o SAMU. Asseverou que o motorista do ônibus só parou para socorrer a autora no próximo ponto. Como se vê, as declarações da testemunha corrobora integralmente a inicial, confirmando a velocidade inadequada ("correndo"), a passagem abrupta sobre o obstáculo ("passou no buraco") e a violência do impacto sobre a autora (lançou a autora do banco, que quase bateu no teto). Demonstra, ainda, a falha no dever de assistência imediata, ao afirmar que o motorista só parou no próximo ponto, o que agrava a conduta do preposto da requerida. Esta versão dos fatos supera a narrativa do condutor do ônibus, ouvida em sede policial, que tentou minimizar o ocorrido como uma mera frenagem sobre "ondulação".
Restou, portanto, inequivocamente comprovado o defeito na prestação do serviço (Art. 14, § 1º, CDC). A alegação de culpa exclusiva da vítima resta rechaçada pela prova testemunhal. Subsidiariamente, a defesa investiu na tese de concausa, apontando que a autora possuía lesões prévias (fratura antiga em L5 e osteoporose). Para dirimir a questão, foi determinada a realização de perícia médica judicial.
O laudo pericial, elaborado pela Dra. Mariana Toyo Nakano, é técnico, imparcial e conclusivo. Ao responder ao Quesito 1 da seguradora, a perita confirmou a lesão atual: "A autora sofreu fratura por compressão do corpo vertebral de L2, conforme demonstrado por exame de tomografia computadorizada realizado em 13/04/2024...".
Ao analisar o nexo causal e as lesões preexistentes (Quesito 6), a expert foi categórica ao estabelecer a concausa: "Não exclusivamente. A autora possui patologias pré-existentes na coluna lombar, incluindo fratura consolidada antiga de L5 e lombalgia crônica. [...] o acidente descrito provocou uma nova fratura em L2, a qual gerou impacto funcional e agravamento do quadro prévio. [...] Tal situação caracteriza-se como nexo concausal, nos termos da classificação de Schilling, tipo III – quando o acidente agrava uma doença ou sequela anterior que, isoladamente, não produzia incapacidade."
A existência de concausa preexistente (a fragilidade óssea da autora ou a fratura antiga) não rompe o nexo de causalidade nem exime a ré de responsabilidade, nos termos do Art. 734 do Código Civil. O transportador assume o risco de transportar passageiros com suas vulnerabilidades individuais. O evento (solavanco violento) foi a causa direta e eficiente para a nova fratura (L2) e para o agravamento do estado de saúde da autora. Estabelecida a responsabilidade, resta apurar os danos. A autora pleiteou R$ 306,00. Em réplica, reconheceu o equívoco na juntada de recibos de 2023 e requereu a desconsideração destes, mantendo-se os comprovantes de 2024, compatíveis com o tratamento da lesão. Assim, o dano material comprovado e devido totaliza R$ 180,04.
Quanto aos danos morais, sustenta a ré que o fato configura "mero aborrecimento". Tal linha argumentativa, contudo, não se mostra convincente e razoável. A passageira, idosa, sofreu uma fratura de vértebra em decorrência de condução imprudente. Foi obrigada a usar um colete ortopédico por aproximadamente três meses, conforme relato da testemunha e prova pericial.
A testemunha, ainda, relatou que ela "gritava de dor" e que o motorista, inicialmente, não prestou socorro. Ademais, o laudo pericial concluiu pela existência de sequela permanente (Quesito 5): "Os déficits encontrados caracterizam invalidez parcial e permanente de grau moderado, considerando a limitação funcional detectada na coluna lombar. Trata-se de sequela funcional definitiva...". A fratura de um osso da coluna, a dor aguda, o longo período de recuperação comcolete e, principalmente, a constatação de uma invalidez parcial permanente, ultrapassam a esfera do mero dissabor...
Ante o exposto, julgo parcialmente a ação principal (Art. 487, I, do CPC), movida por M.G.F, para condenar, solidariamente, as rés TRANSPORTE COLETIVO GRANDE MARILIA LTDA e EZZE SEGUROS S.A, ao pagamento de:
a) R$ 180,04 (cento e oitenta reais e quatro centavos), a título de danos materiais, corrigidos monetariamente
b) R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a título de danos morais, corrigidos monetariamente. Pela sucumbência mínima da autora na lide principal, condeno as rés (Transporte Coletivo e Ezze Seguros), solidariamente, ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios ao patrono da autora, que fixo em 15% (quinze por cento) sobre o valor total atualizado da condenação (Art. 85, §2º, CPC)".